segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Natal, doce Natal


Era o dia mais feliz do ano. O dia de Natal.
Começava com a “matança do porco”, que envolvia os homens da família, ainda a madrugada se espreguiçava. Altura em que eu acordava com os gritos do pobre animal, que me revolvia de penas. Eu chegava mesmo a deitar uma lágrima que a minha mãe se apressava a calar com um “não penses assim, senão ele demora mais tempo a morrer”… e eu, lá engolia o remorso sem querer sequer espreitar! A tristeza acabava por me passar à mesa, quando o “sarrabulho” e a “cachola” frita acalmavam o meu estômago de criança, acutilado pela fome e pelo cheiro que emanava pela casa.
Era sobre a lareira da avó que se dependuravam as “linguiças” e os “chouriços” a pingar para as brasas, e onde as panelas fervilhavam cozinhando a cabidela e aquecendo a água para lavar as loiças em alguidares de barro.
Nessa altura, já a mãe tinha amassado a massa das filhós com todo o preceito e perseverança, esticando a mesma com um rolo e recortando geometricamente retângulos que pareciam ter dois olhinhos no centro, colocado sobre um lençol imaculado de branco à espera que alguém as levasse para a frigideira de alumínio azul, onde deveriam ficar louras e estaladiças – como eu gostava – ou grossas e macias – como gostava o pai. Quando chegavam ao alguidar de barro para serem agraciadas pelos pequenos cristais de açúcar branco, já as costas lhe doíam tanto que mal conseguia levantar os braços, mas estava feliz com o sorriso da família que aguardava, impaciente por poder provar…
O tempo passava lentamente, sem horas para nada, e não se prestava muita atenção aos mais novos. Basicamente podíamos fazer o que nos apetecesse, salvo quando nos sentavam para comer: colocavam na nossa frente os pratos, novamente azuis de alumínio brilhantes e nas mãos os garfos de metal de dentes longos e tortos, de tanto serem usados. Molhávamos o pão molinho, cozinhado no forno a lenha na véspera, naquela confusão de sabores e era um deleite…
Depois voltavam as brincadeiras. Os “escondarelos” eram os preferidos, e de quando em quando, havia uma corrida entre as mulheres sentadas perto da lareira, o que podia fazer tropeçar num pau do fogo e fazer saltar fagulhas para as saias pretas das avós…isso, dava direito a uma boa palmada, que nunca fez mal a ninguém, seguida da gargalhada geral.
A noite chegava coberta de neblina, mas só lá fora fazia frio. O calor da harmonia reinava nos corações e nada faria mudar esse ambiente. Nem os presentes que se repetiam, sobretudo as meias, as cuecas e os chocolates “Regina”! Também o chocolate quente, feito na “escolatêra” da avó, marcava pontos no perfume que se propagava no ar!
Lembro-me das vozes dos primos, emigrantes vindos de França e dos Estados Unidos da América, assumindo o protagonismo, por contarem histórias de sofrimentos e de vitórias, tudo para “ganharem o sustento” e “terem uma vida melhor”. Nada que as férias na terra natal não apagasse, não desse forças para voltarem e fazerem mais e melhor.
Recordo ainda as “modas” iniciadas pelo pai, o “alto” da mãe, e acompanhadas por todos os outros, e da voz desafinada da prima (a única que não sabia nada de música, mas conhecia as letras todas e adorava cantar) que levava toda a gente para o tom errado, levando à gargalhada até às lágrimas, como era habitual.
Era o serão de jogar às cartas com vários baralhos, pois cada grupinho jogava o que sabia: as crianças jogavam ao “burro”, as mulheres à “bisca” e os homens à “sueca”, batendo com os nós dos dedos na mesa e fazendo os sinais que nós não entendíamos, mas também não nos interessava nada. Só ouvíamos os copos de vinho tinto a baterem na mesa e os brindes “à saúde e que para o ano estejamos todos cá novamente”! Tudo porque o vinho era caseiro, feito pelo pai, em pipas de barro com todo o cuidado, para chegar àquela noite “no ponto”!
À meia-noite era a debandada rumo à Igreja Matriz para a “missa do galo”. Geralmente fazia um frio tal, que se entranhava na lã dos gorros e feria as orelhas, e os olhos lacrimejavam, e enregelava a ponta do nariz e fazia o vapor sair apressado pela boca. Mas todos tinham que ir rezar a Nossa Senhora da Conceição para serem absolvidos dos pecados cometidos ao longo do ano e para os pais terem saúde e poderem cuidar dos filhos e dar-lhes tudo o que eles não tinham tido, e os filhos pediam para resolverem coisas de crianças. O beijinho ao “Menino Jesus” dava o ânimo final.
Quando voltávamos para casa, já o sono vencia os pequenos e éramos deitados todos juntos nas camas, para aquecermos mais depressa, o que era outro divertimento.
E os adultos voltavam aos jogos e cantorias até ser dia novamente. Era o dia mais feliz do ano.
Rosa Alentejana
27/12/2014
(imagem da net)

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Presente de Natal


Brilham luzes lindas na árvore
Ficam os chocolates suspensos
Os anjos com olhos de mármore
Logo perto dos embrulhos densos

Mas a prenda que eu tanto queria
Está ainda escondida na tua casa
Sem caixa, papel, fita ou até magia
Envolto num perfume que me arrasa

Tens na pele o sabor dos chocolates
Na boca o hálito a palavras profanas
No toque a cor de um vinho escarlate
Que sobre o meu rosto e corpo derramas

Quando sinto esse teu terno aflorar
Nem que por breves instantes apenas
É como se Pai Natal me viesse ofertar
O seu mais doce e cândido Mecenas

E a beleza dos traços do teu rosto
Fulgura ternamente para mim em esplendor
De tal forma que termina o meu desgosto
Porque o meu presente é o teu amor!

Rosa Alentejana
(imagem da net)

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Conjecturas


Não sei que magia tem
a pena que fazes suspirar
no branco do papel
mas tem o poder de desmoronar
o muro construído
no cimo das decisões
do meu olhar

Transcende-me os poros
que ficam a descoberto por cada
traço que sigo
ternamente
com os olhos embevecidos
e a alma desnudada
e acaricia-me em silêncio
num tom de promessa
que me deslumbra

E nas dobras do papel
pedaço de tempo amarrotado
guardas os gestos por fazer
na meiguice das tuas mãos
e entregas serenamente
ao ocaso
esse acaso do toque
em cores por desbravar

São esses farrapos
de felicidade fundida
em nossos lábios
que embelezam a poeira
grudada ao relógio
delator resoluto
das nossas vontades
derramadas nos poemas
incinerados ao luar…

Essa pena queima-me a morna
insensatez crescente
e, qual baralho embaralhado
pelas tuas palavras,
espalha-se em miríades
de cristais cálidos
dentro de nós
num fogo lento
aguardando
o reconhecimento!

Rosa Alentejana
19/12/2014
(imagem da net)

domingo, 14 de dezembro de 2014

Pressuposto


Tenho na concha das mãos
a forma vazia do teu rosto
e na boca o mel dos lábios
desse sabor
pressuposto

Rosa Alentejana
(imagem da net)

sábado, 13 de dezembro de 2014

Por vir


Por vezes temos momentos
cristalizados
na memória,
e tal como as gotículas da chuva
agarradas à teia da vida,
desesperadas por não cair
no silêncio do desengano...
embaladas pela brisa do tempo
frio de madrugada invernosa
deixam-se ir...
numa luta perdida
onde o nada é a única esperança
que está por vir.

Rosa Alentejana
(imagem da net)

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Embranquecer


Há tanto tempo
amor
que não me tocas nos cabelos
tal como a brisa beija o mar
em vagas de desvelos…

Tanto tempo passou
amor
desde o último olhar
sobre a minha pele ardente
como a abelha ao redor da flor
gemendo pelo pólen
secretamente…

Tanto…tanto tempo passou
amor
desde o último abraço
como o sol enlaçando o trigo
nutrindo-lhe as suas raízes
como tu fazias
à pele do meu regaço, teu abrigo…

Eu sei
o tempo esfumou-se
no nosso olhar
e acinzentaram-se as têmporas
no espelho do presente
e os nossos passos cansados
de tanto palmilhar estradas
tornaram-se o eco dos dias dormentes…

Mas sabes
ainda amo o teu olhar
as tuas mãos
os teus passos…
e ainda invento motivos tolos
para contigo me cruzar…

Ainda mergulho na solidão imensa
do segredo que guardo para ti…
ainda te espero…
ainda te quero…
para mim.

Rosa Alentejana
05/12/2014
(imagem da net)

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Ecos


Todos os sons que conheces pertencem ao timbre expresso da minha escrita.
Tal como árvore a desfazer-se em sonhos, nascida à beira do desfiladeiro da tua pele, lugar secreto que não me canso de descrever, derramo fantasias de lava incandescente da minha caligrafia.
Torneio a tua face, com a lentidão dos meus dedos plenos de vogais ardentes, contorno a maçã do teu pescoço com as letras na ponta da língua…humedeço os lábios de uvas maduras e fico ali…à beira do teu querer!
Conheces todas as entoações dos meus verbos, todas as nuances de cada consoante e até cada realce que coloco em cada provocação nas sílabas da minha ilusão. Tu entendes-me…
São os teus olhos que inspiram cada variação da minha letra: num tremor arrojado quando sorris, mais ousada quando sopras uma intenção, mais carinhosa sempre que te demonstras candidamente nostálgico…como se um conto de fadas, erigido num dia embrumado, pudesse ser escrito, de cada vez que me lês…tu entendes-me…
São essas tuas mãos mornas e macias que vivem nas reentrâncias de cada soneto, acariciando cada hipérbole, roçando cada metáfora, tocando cada letra onde mais ninguém pode chegar…tu entendes-me…
É a tua boca que reveste cada verso, no reverso dos poemas que trocamos, como um cálice embriagante, doce, terno, que habita as entrelinhas das minhas prosas num misto de perfumes de rosas e desejo de inferno que eu quero ter!
É o teu corpo o tecido em branco que me assenta tão bem, como vestido feito por medida, onde te descrevo o anseio que se esconde através da película breve que nos separa as dermes…tu entendes-me…
É aí, no ombro alado da saliva dos meus escritos, que me amas com ternura, num misto de sonho e literatura, que revives a monotonia de cada interrogação, que nomeias as exclamações um bem maior para a leitura dos meus segredos…tu entendes-me…
E sobra sempre o eco da minha escrita embatendo nas ilusões…

Rosa Alentejana
02/12/2014

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Sobre o cante alentejano


Primeiro alinham-se os lenços, aconchegam-se as samarras aos ombros já cansados de tanto sol, e o chapéu ligeiramente tombado sobre os olhos sombreia a face corroída em forma de mapa de caminhos secretos e secos, de uma vida aberta ao campo, como o peito de um alentejano pleno de voz…
Depois escuta-se o pigarrear risonho dos homens, na sua lida ordenada pelas posições que cada um sabe que vai ter, com o arrastar dos passos tantas vezes ensaiados, e os braços entrelaçados num olhar partilhado que entrega o entendimento ao “ponto”.
Quando desponta a sua voz grave do íntimo abandono à ceifa, abrigada à sombra que não sobra das azinheiras, tira-se o pão do “tarro” já duro e que endurece ainda mais a terra. E surge o fino fio de azeite entornado sobre as “migas” paridas pela madrugada, num esforço por renascer a alma e o corpo, mais a água da “quarta” de barro, fresco farrapo de consolo bebido pelo “cucharro” e oferecida pelo “aguadeiro”.
E o “alto” desperta da solidão, tal como rouxinol cantando à beira do desaguar de um rio, juntando-se a ele o “rancho” como pardais em debandada com a chegada do raiar do dia.
Dizem que o cante é triste como a azeitona negra e madura, que reflete as folhas verdes da esperança por mais um dia de ”jorna”…que sobram os fados guardados no amor à terra e que a forma dolente das vozes espelha o cheiro dourado que têm as espigas…que enaltece o rubro arrufo que tem o girassol quando as papoilas abraçam as suas raízes…que a “madorna” do calor é inspirada na flor branca da esteva ao soluçar a sua sede pela água de um ribeiro…que o mocho pia no outeiro de noite porque sente a lágrima da lua a chegar ao monte…
Não sei, mas posso muito bem adivinhar que o povo fica feliz quando os ouve cantar!

Rosa Alentejana
27/11/2014
(imagem do Diário do Alentejo)

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Violência


Não sei bem quando comecei
a recear olhar para os animais
para as pessoas, para os jornais
só não o posso fazer, isso sei

Mas não quero que ouçam meus ais
porque aqui em casa existe a lei
de te abraçar quando dizes “cheguei”
e de “apanhar” quando te vais

Mas, carinhosamente, deixas dito
que me amas e prometes mudar
sempre que, no silêncio, solto o grito

que ninguém ouve ou quer escutar
porque é só meu o martírio contrito
e na segurança do lar, quero ficar!

Rosa Alentejana
26/11/2014
(imagem da net)

Asas


Pergunto ao relógio do dia
se sabe quanto tempo passou…

Sei que as minhas asas estão expostas,
mas ninguém sabe
que a minha liberdade voou…

Não sei se foi naquele aniversário,
em que juntos fomos ver o mar,
ou se foi no dia em que ficámos
em casa a namorar,
sei que os dias se tornaram noites.

Onde foi o sonho foi morar?

Ajeito a toalha da mesa,
num gesto cuidado e ternurento,
tal como os pratos que faço
para o teu apetite violento.

Mas de nada me adianta
ser a fada do lar,
quando a tua fúria se agiganta,
nada te faz parar…

Ainda assim, sou feliz.

Tenho quem me ajude a pagar as contas,
tenho carinho e um lar
e felicidades…tantas…

Sou a rainha obreira dos teus desejos,
sou a fiel depositária dos teus beijos,
sou a guardiã do teu amor tão doce…

sou…

tua…

Só não sei como olhar as pessoas
daquela forma que gostarias…

Nem sei como afagar os animais
da maneira especial como o fizemos um dia…

E esse olhar acusador
que lateja no meu pensamento
torna-se lava incandescente
no martírio que lamento…

Apetece-me o pó
da terra, mas quem não erra?

Acabo por te perdoar
e o ciclo continua nas entranhas
deste delírio de amor
e ódio e raiva
onde a vida para e recomeça
e não sei onde vai acabar.

Rosa Alentejana
26/11/2014
(imagem da net)

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Mais uma página


Ontem escrevi para ti mais um texto, mais uma quantidade de frases vistas e revistas com os olhos da alma, onde depositei a fome das letras, os longos dias de chuva onde não há verbos…
Tantas foram as metáforas encontradas para explicar o meu desejo pelas vogais da tua boca, pelas reticências abrigadas nas pálpebras dos teus sonhos, que caíram relâmpagos rejubilando nos olhos das estrelas, como se fossem um temporal de sorrisos!
Engravidei os parágrafos, na organização das ideias, e expliquei-te a tristeza da ausência das tuas mãos, a displicência das sílabas quando te afastas demasiado tempo…mas tu não te importas com a pressa que tem a chuva ao cair dos olhos do céu, nem te causa transtorno o enrugar da copa das árvores plantadas mesmo em frente da tua casa!
Eu sei, foi apenas mais um texto acoplado à carência de mais uma página, mais uma metamorfose do relógio barulhento da biologia da minha escrita…mas, quero que saibas que apesar das promessas ao sol (que um dia há de brilhar para mim) eu sei que te olhaste ao espelho, sorriste o teu sorriso triste e continuaste o teu caminho.
Porém, tomei a liberdade insana de reservar mais uma tranche de versos grávidos de amor e guardá-los na lembrança da tua fonte…espero que um dia os rasgues se não houver retorno, mas, por enquanto, abraça-os e deixa-os nascer, não vá a fonte secar!

Rosa Alentejana
21/11/2014
(imagem da net)

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Asas nas letras


Tenho asas nas letras
preciso delas para voar
quem sabe em quantos sonhos
conseguirei pousar?

Conto estrelas conto luas
dias cadentes a passar
vejo até o infinito
mas não vejo o teu olhar…

Sinto a brisa nos cabelos
e a pele a borbulhar
mas esse Vento que invento
apenas nas sílabas me vem beijar…

Tenho asas nas letras
preciso delas para voar
quem sabe em quantos sonhos
conseguirei pousar?

Deito-me nas constelações
faço meu o leito do luar
beijo as nuvens, abraço o sol
mas não te consigo tocar…

Faço vestidos do arco-íris
no pó das estrelas vou dançar
enfeito coroas de ocasos
mas fico sempre por ti a esperar…

Tenho asas nas letras
preciso delas para voar
quem sabe em quantos sonhos
conseguirei pousar?

Busco o brilho da aurora
boreal no céu do ultramar
mergulho nas fronteiras do Olimpo
mas jamais te consigo chegar…

Procuro o teu nome no latim
ou em qualquer língua rimar
mas só tenho estes pobres versos
como oferenda para o teu olhar

Tenho asas nas letras
preciso delas para voar
quem sabe em quantos sonhos
conseguirei pousar?

Rosa Alentejana
18/11/2014
(imagem da net)

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Repara...


Repara, sou eu a flor com vida, que convida os teus olhos ao passeio pelo apelo da pele nas pétalas do meu corpo, colírio secreto para as pálpebras semicerradas de mim.
E sou também a seiva que pulsa nas veias com sabor a verde vinho embriagante e que semeia o odor ilícito na raiz dos teus sentidos, transformando em bálsamo esse sorriso fascinante do cálice dos teus lábios tão queridos.
Também sou fruto fecundo poisado na fornalha da polpa dos teus dedos, quando em brasa germino no mel em flor dos murmúrios dos teus segredos.
Ah…e sou o ventre da terra, a guarida guardada para o abismo aberto à sede da tua boca, quando segregas o desejo safado albergado na tua saliva!
E por fim, sou mar macio que revolve as tuas amuradas e sorve sôfrego, o cio das tuas palavras carinhosas, amadas, que fomentam o sonho de tocar-te em ondas emplumadas.
Rosa Alentejana
17/11/2014
(imagem da net)

domingo, 16 de novembro de 2014

Parágrafo da vida


Foi na história de hoje
e não noutro lugar
que caminhei sobre as linhas
deste caderno de folhas brancas e lisas
e me insurgi contra as palavras
onde parei
e te olhei nos olhos
de um poema por construir.

Eu sei que são feitas de raiva
esmagada pela fé e banhos de luz
as minhas mágoas
e, por isso, soletro fases
em que me abraças,
desenho letras nos beijos da tua boca
mas, em lugar algum te encontro!

Mas hoje…hoje cruzei os passos
pelo parágrafo parado da minha vida,
e numa bola de neve cada vez maior
embrenhei-me na saudade
e escrevi o poema perfumado
a amendoeiras em flor
do hálito da tua boca,
e embriagada,
reproduzi
o filho que te ofereço
no amor
de te olhar!

Rosa Alentejana
16/11/2014
(imagem da net)

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Maçã


Tu
que cresces na crueza expedita
da árvore a que chamo de vida,
minha sina,
ensina-se as nervuras
das ternuras
que seguras na tua pele!

Tu
que ramificas os desejos
incólumes de beijos
pelas rotas já esquecidas de mim,
indica-me o caminho
inscrito
na palma da tua mão,
meu indecoroso jardim!

Tu
que floresces a flor
da pele fantasiosa
de forma planeada e meticulosamente
adiada
sussurra-me o teu nome
pausadamente
na nua vontade
por mim nidificada!

Tu
que moras nesse fruto másculo
e meloso,
orvalhado pela madrugada,
morde-me os lábios
dos sentidos,
e como num sonho,
penetra-me os gemidos
lambuzados
na seiva que circula nas
minhas entranhas e me faz
viver!

Tu
que fazes do fogo do corpo
a minha eterna labareda
porque ficas falando
dos dias,
se isso já não me chega?

Nos teus pensamentos
enraizados no entardecer
quero ser a fonte meiga
desse amor onde quero
morrer…mas não para a vida,
que essa ainda tem sumo
que pretendo beber…
apenas para o passado cansado
como pomba
que ao voar
perdeu o arrulho
e rumou ao escurecer…

Eu quero é morder a maçã
da letra soletrada
na ramagem luxuriosa
dos teus braços,
e ainda que a lua venha “enluarar”
os nossos passos,
tu sabes que chegou a hora
do poema
nascer!

Rosa Alentejana
14/11/2014
(imagem da net)

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Âmago


Mais uma volta sobre os lençóis
amarrotados da manhã
e um simples toque
cristaliza-me os sentidos
orvalhados de hortelã,
pimenta do meu cheiro adulterado
pelo desejo de morder
o ópio dos teus lábios.

Sabor nacarado que quero
para mim, para o meu corpo,
para o apelo da minha pele…

É por ti que espero,
como cacho de uvas aguardando
pela vindima das mãos
que tanto desejo.

Sou eu a musa dos delírios
que emanas na nudez da tua arte,
quando atrevida lambo
os teus versos, com a avidez
do beija-flor, que feliz
desperta o doce canto
das pétalas do seu amor?

Diz-me ao ouvido
o segredo sagrado que guardas
na polpa dos dedos,
e abre-me os trilhos da estrada
florida, onde assumes o teu leito
de rio, e extravasas o cântico
no âmago do meu poema
de mulher…

E acordo para mais um dia
onde o aroma do café se mistura
com as palavras de ternura
murmuradas pelo silêncio
em que te sinto perto
na vertigem do que é certo
ou errado
para alguém entender.

Rosa Alentejana
12/11/2014
(imagem da net)

domingo, 2 de novembro de 2014

Sentes?


Bebo o vinho presente
em cada palavra defraudada
pelo silêncio deste infinito
de letras silentes,
que vibram na polpa
dos meus dedos…sentes?

Infiltram-se no meu sangue
como droga faminta
das minhas ideias
e dos meus sentimentos,
em longas vagas sussurradas
no meu ventre,
nas minhas têmporas,
no meu peito
e na vulnerabilidade dos meus lábios
agora dormentes…e tu sentes?

Eu transpiro sílabas
num delírio febril e amargo,
compilado nas frases sedentas
pelo hálito do som
que não escuto
do mel da boca amada…ah!

Eu morro no veneno do tempo
descrito em sonetos,
quando me caem métricas
emparelhadas em lonjuras,
quando a gramática da vida
sai batendo a porta, ereta e rígida,
quando a pergunta retórica fica no eco
de um futuro clandestino
e amarfanhado no meio do chão…
mas tu sentes?

É apenas o bombear público
do músculo frágil
que é o meu coração!

Rosa Alentejana
02/11/2014
(imagem da net)

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Venero-te


Venero-te templo
no desalinho dos meus desejos,
quebrado pelo ADN
impresso nos lábios
onde guardas os beijos.

Venero-te templo
coberto pelo manto sagrado do tempo,
sincopado aleatoriamente,
quando a luz das velas veneradas
dos teus olhos
aquecem as fugidias retinas dos meus.

Venero-te templo
da derme sublime,
onde entrelaço sabores em teias de anseios,
na cerimónia lúbrica
onde consagras o teu amor aos meus seios.

Venero-te templo
na aura prodigiosa do encontro no altar
que é o início da vida,
quando a luz se derrama pelos nossos corpos,
numa eterna chegada…e partida.

Venero-te templo
no culto delicioso
onde prostrada me entrego
a cada recanto profanado apenas por ti…
na pureza imaculada do leito
que é apenas nosso e onde…
renasci!

Rosa Alentejana
30/10/2014

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Face e forma


Que o ar se solte livre
do corpo que é vida
no teu olhar
e que esse latejar
se renda solene junto ao peito
no recanto escondido
do coração a bombear
ribeiros, rios e mares de palavras
tão ternas como o leito
derramado
nas noites vertiginosas
de luar

Que a tua mão
caia caduca na minha
como folha branca
ensaiando a dança
da caneta atrevida,
quando o poema se aninha
nas nervuras
da nossa perfumada lembrança
em linhas onduladas de prosas
de amor embebidas

Quem de nós dois irá disfarçar
o sorriso segredado
ao ouvido, numa surdez de demoras
à beira das águas espelhadas?

Somos face e forma de um mesmo lugar
de mãos dadas
sem tempo para sublinhar
o vazio dos sonhos
entre nós…a pairar!

Rosa Alentejana
27/10/2014
(imagem da net)

domingo, 26 de outubro de 2014

Planície de solidão


Eu não queria mais
do que ir longe,
ao fim da planície adormecida,
onde as espigas
tocam o horizonte
e lhes transmitem
toda uma palete de sonhos.

Só queria que eles
não fossem rocha,
como de rocha rasa e escorregadia
são os dias.

Queria apenas lançar daqui
um manifesto
contra o ciclo das estações
que me rasgam por dentro
e ateiam as brasas
que esmorecem
a minha derme em gritos.

Sou o parco sorriso
ajoelhado no cimo do monte,
aspergindo leves beijos tristes
sobre o desfiladeiro do teu corpo…

Sou o ténue fio de desejo
murmurado aos quatro ventos
nos sonetos que engrandeces…

E sou a clareira acesa
nos braços da natureza
que não vinga,
porque as palavras já não têm raízes
para segurar o encanto!

Por fim, considero que falhei,
porque já não sou farol
no penhasco das tuas mãos.

Agora sei que sou
queda abissal
nesta planície de solidão.

Rosa Alentejana
26/10/2014
(imagem da net)

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Poeta sem alma


Sou eu o poeta sem alma
nesta solidão de palavras
de mãos vazias
como borboletas
escritas
sem asas

Dói-me o chão por cultivar
nesta aragem sobranceira
quando seca
a fonte,
num imenso latejar,
soluça de saudade
o sal da caligrafia
verdadeira

Já não me sobram poemas
nem sílabas para versejar
pois,
ainda as letras se perfilam
mas, para elas, ainda
que a música sussurre,
eu já não encontro
o par

Por mais que eu plante dias
no deserto do meu pensamento
não há cores, não há sons
nas palavras
que triste
invento

Vou escavar sorrisos ao sol

Vou lavrar pétalas de rosas

E a partir deste momento
vou renovar as minhas prosas

Suspirando junto da fonte,
plantando casulos
no mundo,
na eventualidade
de descobrir algo mais profundo
como o vocábulo
emergido
da terra
revolvendo a naturalidade…
surge a palavra
Amor!

Rosa Alentejana
22/10/2014
(imagem da net)

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Almejado sol


E os gestos vão deslizando
mansos
pelas estações da vida,
displicentes,
ao som das chuvas e ventos,
numa azáfama corriqueira a banal…

Augura-se, ao longe,
nos palácios de serras reluzentes, o sol

Pois, que seja de sol
o discurso que me sobeja
da boca apaixonada
pela crónica da vida
vista da íris dos teus olhos!

E que seja de sol
a palavra
amorosamente melosa
que escrevo com grafemas gratos
pelo hálito de desejo
provindo dessa nascente
que me dilata a vontade
de um beijo
dessa tua boca!

Que seja de sol
cada toque
sensual e servil

Que me embale o corpo

Que me morda o arroubo
das sílabas salivadas
ao ouvido morno
onde deponho as cores
do poente que teima em entardecer

Ah! Que seja de sol
a sede
que me embarga a sombra
dos poemas vespertinos
que mansamente ofereces
ao meu viver

E que seja claro o sol
que me sombreia a vida
em cada gomo triste
que saboreio
em sal
quando das tuas mãos
aguardo um gesto apenas
em forma de sinal

E aguardo-te sol
na vontade imensa que me liquefaz!

Rosa Alentejana
21/10/2014
(imagem da net)

domingo, 19 de outubro de 2014

Amar


Por favor, deixa-me escrever
sobre os raios de sol
como fios de vida
coloridos
no equilíbrio de uma caligrafia
livre, para os teus olhos poderem ler

Por favor, deixa-me escrever
sobre as pétalas do girassol
amarelecendo os campos,
eterna guarida
para as minhas garatujas,
para ti,
em cada expressivo
alvorecer

Por favor, deixa-me escrever
sobre os malmequeres
de mágoas brancas
quando te perco
e desconheço onde andas
e os meus dias
ficam em claro enegrecer

Por favor, deixa-me escrever
sobre a alegria que dança
nos meus olhos ao ver
os teus
quando a retina te alcança
e as lágrimas sucumbem
num arfar de prazer

Por favor, deixa-me escrever
sobre as águas que correm
bravias e mansas
em cada sonho
que ainda quero viver

Por favor, deixa-me escrever
sobre as labaredas da raiva
quando os gestos
são projéteis
que as palavras
já não são suficientes
para o que te quero dizer

Por favor, deixa-me escrever
sobre a terra fértil da glória
quando o meu desejo
é semente de carinho
que tenho
para te oferecer

Por favor, deixa-me apenas escrever
sem condições nem amarras
que os meus gritos
são apenas aparas
do lápis que uso
para, nos meus textos,
te poder amar
sem padecer!

Rosa Alentejana
19/10/2014
(imagem da net)

sábado, 18 de outubro de 2014

Carma incondicional


São os teus lábios polpa doce que me ofereces
em sabores cálidos como o desenhar de prosas
nesse jeito manso, tão terno, quando me roças
a pele em beijos delicados, nirvana de benesses!

São os teus dedos os mensageiros das rosas
cobertos do perfume, que é néctar dos deuses,
para a boca que é minha, quando me aqueces
no toque das tuas mãos, em vagas deliciosas!

E sinto-me a benemérita usurpadora celestial
do palácio que ostentas em gemidos sagrados
quando em mim vertes esse teu amor especial…

E somos anjo e demónio numa paixão ancestral
através dos corpos, vestígios pelos dois venerados,
como carma vagaroso, carinhosamente incondicional.

Rosa Alentejana
18/10/2014
(imagem de BERNINI. 1622.
PLUTÓN Y PROSERPINA.
(Detalle))

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Delírios pintados de azuis


Diz-me de que é feito o teu tempo.
É de folhas que caem como lágrimas de dias cada vez mais curtos, ou de arroubos momentâneos do vento que cruza o ar que respiras e nunca fica…é feito de bancos de jardim solitários nos jardins da tua passagem, ou enche as mãos que usas para abarcar o amor que guardas em pequenas gotículas, em avaro pretexto para me consolar?

Diz-me de que é feito o teu perfume.
É de neblinas frescas sobre as flores que ficam sob a varanda da janela do teu quarto, ou da brisa que vem do teu mar de azuis em conchas de doçuras mascavadas a anis do teu olhar…ou será das sombras deliciosas dos carvalhos e pinheiros-mansos dos montes fecundados pela Lua onde pousas o hálito das tuas palavras?

A tua ausência está pintada no quadro desbotado dos meus braços a tinta indelével.
É nas cores do por do sol dos meus olhos que te encaixas, dia após dia, como se fosses nuvem no céu da minha ilusão, e jamais te pudesse tocar!

A sombra do teu corpo vive resignada na morada da minha pele, como queimadura incandescente e dolorosa, feita pelos banhos de luar onde me tentas, onde me deitas, onde me beijas, onde me vens usurpar o cio, como lápis de carvão em folha de papel desenhando poemas, num eterno versejar!

Quando acordo, vejo apenas a luz que deixou o sol, quando beijou a almofada de penas que tenho a meu lado…numa prece à madrugada pelo delírio que enfeitou o sonho que guardo para te dar.
Rosa Alentejana
16/10/2014
(imagem da net)

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

No abrigo das palavras


Escorrem-me palavras pela boca do dia nesta tarde de outono.

E eu, impávida, multiplico cada uma por mil, em equações que não sei calcular. Nunca soube. Tal é o tamanho do infinito desejo que me alucina, tal é o cansaço elevado ao fracasso onde mergulham os meus poemas.

Mesmo que aladas, as palavras sobrevoam apenas o roçar dos teus lábios, sem nunca lhes tocar.

Mesmo que açucaradas nem sequer se aproximam do mel que há na tua pele, ainda que a rimar.

Por mais que as imprima no papel amarelado do tempo que passa, pardo, elas não te são a seiva da vida, não te transmitem a vontade de serenar os olhos tristes do meu coração.

Embelezam os cadernos amarrotados e já rasgados pelo folhear dos dias que escolhes, e voam…voam ao ritmo dos juízos que não me importam.

Voam ao sabor do sol e das cassiopeias estampadas nos céus da minha imaginação…sou fraca, sou forte, sou nada e tudo num acesso proibido ao mundo onde se esconde a desilusão.

Mas continuam a transbordar-me como encruzilhas, como motores, que ressoam no eco vibrante da escuridão onde persisto.

E tomo o caminho das frases como mosto que me aquece as veias no albergue das tuas mãos e aguardo…o espelho indolor que abraço como náufrago sobre as águas em forma de sujeição.

Talvez um dia…seja eu o perfume que se escreve, com a tua caligrafia de alegria, quando o teu sorriso se abre para uma nova jornada.

Talvez um dia…as portas de cada divisão, da casa que sou, se abram rumo à morte…da saudade.

E vou sorrindo às palavras, vício melancólico que me resta no dicionário onde busco, incessantemente, o abrigo da chuva da nossa realidade.

Rosa Alentejana
08/10/2014
(imagem da net)

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Faltas-me


Quando o céu se rasga
em nuvens copiosas de rios
de lágrimas
e o coração explode em conformidade,
ressoa e ecoa
uma dor dolorosa
porque me faltas…

E cabes-me no filamento etéreo
do vento suão
que me embaraça os pensamentos
numa ausência
em forma de furacão
que me abarca…

E vertes-me aluviões
de carências
sobre a terra ressequida
da pele em chamas,
porque resides apenas
na imaginação
das tempestades que provocas…

Sombra fugidia
que escorre pelas vidraças
do meu olhar…
toca na minha mão
e não me deixes mais…
chorar!

Rosa Alentejana
07/10/2014
(imagem da net)

domingo, 5 de outubro de 2014

Labirinto da vida


Perdes-te tantas vezes na vida como as que acordas pela manhã.

A vida é um labirinto onde os caminhos se assemelham, mas que tens que escolher imperiosamente, sem tempo para pensar nas dúvidas. Mais floridos ou mais empoeirados, menos ensolarados ou menos chuvosos, uns pesados, outros leves, outros, por vezes, vergonhosos…

No entanto, todos escapam entre os ponteiros vagarosos ao ritmo desenfreado do tempo…

Se não encontrares momentos felizes, encosta o sapato à pedra que te enfrenta e luta! Mas luta como se de um jogador de futebol se tratasse, dá um chuto e faz o golo, desfruta o momento antes que se acabe!

Não sofras calado as tuas desventuras, perdendo os passos! Procura voar nas asas dos anjos que sempre te amparam e continua a caminhar…

Reúne os amigos em volta de um prato recheado de amizade, com sonhos de carinho, abraços de liberdade, segredos fresquinhos e pequenos nadas…e para enfeitar, polvilha de gargalhadas, originadas por palavras que nem foram mencionadas. E um brinde ao vigor em taça encantada!

Se preciso for, pede alguma sorte ao destino das mãos que te são ofertadas, e verás que os teus passos se tornam mais firmes, e tomarás nas tuas as batalhas sopesadas, arremessando com mais força o forte fardo que antes carregavas.

A diferença do atalho és tu que fazes, com um sorriso no rosto, apesar da tempestade. Por muito que te custe, por muito que te falte, há sempre novos trilhos para desbravar, num jamais render durante a busca incessante da…felicidade!

Rosa Alentejana
05/10/2014
(imagem da net)

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

A ferro e fogo


Nos ciclos das luas
dispo o medo brumoso
e quando a noite se deita nas ruas
deixo escapar o suspiro ansioso,
fértil de aspirações e devaneios concretos,
nas palavras que te nomeio
em significados circunspectos.

Pouso os olhos nos enluarados contornos
que assumes ao longe e pinto-te vago
na paisagem de uma tela enganosa
em que os reflexos onde vagueio
pertencem ao imenso lago
da distância amarga e penosa.

Marcas-me o sorriso a ferro e fogo
com o arado da promessa
de que um dia nos libertaremos do jugo
da vida, já sem pressa,
e juntos semearemos um campo
de rosas com pétalas dos nossos beijos.

No entanto,
assumes a margem sobre a ponte
do lado oposto ao meu escurecer
e tantas são as noites em que
o meu horizonte
se acerca dos ponteiros do relógio
e grita e chora, embora
não o deixe transparecer…
que são os meus olhos mares de mágoa
e as tuas palavras simples noz oca
que flutua e abalroa
a vontade de te ter.

Eu sou o teu amparo
Tu és o meu
enlouquecer…

Rosa Alentejana
03/10/2014
(imagem da net)

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Minha seiva és tu


Segredo-te na lonjura
desejos próprios das rosas orvalhadas,
que no despontar das manhãs
já estão desfeitas em madrugadas
de amor.

Murmuro-te nas polpas dos dedos
o desespero das folhas caducas do outono,
quando a ventania urge
no hálito sedoso do sabor do abandono.

Sussurro-te a melodia das pétalas perfumadas,
magias supremas envoltas na pele que vestes
sempre que invento uma música
nas carícias envergonhadas.

Acredita, recebo-te chuva
no viço das minhas raízes, em gotículas rubras
plenas do teu feitiço,
em matizes de abraços felizes!

Crê que és a seiva temperada de que preciso,
num beijo apaixonado pelo mundo que somos,
paraíso ajardinado,
zona de conforto onde te aguardo
beija-flor num sonho tantas vezes…sonhado!

Rosa Alentejana
30/09/2014
(imagem da net)

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Despertar moribundo


Experimento um vazio esmagado, endurecido no esforço de ficar em pé, de maneira a que, não há estaca de osso que me deixe na vertical, tal é o tamanho da minha solidão.

Sinto um cansaço nas pálpebras dos sonhos que já não tenho, porque me choram as ilusões, num choro triste e monótono e abafado.

Estou demasiado sensível ao cheiro a bafio que me escorre pela pele delgada e envelhecida da demora e causa-me agonia e quero apenas matar o dia, hora a hora a escurecer-me…

Aspiro o sono numa vertigem de grito sonâmbulo preso às cordas vocais, e num voo picado sobre o meu âmago, desdobro-me em dores infernais!

Pudesse eu tocar a sombra que não vejo! Pudesse eu abraçar o corpo que não encontro! Pudessem as minhas mãos transbordar as emoções que me consomem!

E acordo do pesadelo, como se a berma fosse a rádio sintonizada na música do teu nome e eu…ainda sinto o arrepio deste entristecer!

Rosa Alentejana
29/09/2014

sábado, 27 de setembro de 2014

Habitas-me


Habitas o meu pensamento, na memória que tenho dos dias que passam arrastando o tempo.

Tenho-te na representação lógica das noites, enquanto a tua silhueta simbólica se recorta na lonjura do firmamento.

Recrio-te vezes sem conta na criatividade que descrevo com versos pobres e insalubres, quando perco a precisão aos poucos, e desbravo palavras na selva da saudade.

Já não sei se embalo o caos de forma voluntária, ou se ele cai sobre mim como cascata doentia, primária…sem que eu tenha a chance de emergir e recuperar o fôlego da realidade.

Habitas cada poema que escrevo, em metáforas de emoções arrebatadas, em cada anáfora repetindo-te o meu desejo, em cada comparação exagerada, em cada gradação dos sentimentos…

Fazes dos meus sonhos a tua morada e do meu coração a lareira acesa onde te aconchegas quando já não sobra mais estrada na minha imaginação.

Sou-te agasalho com calor por dentro, e alimento com sabor a ventre saciado…moras-me no meu prazer adiado!

Rosa Alentejana
27/09/2014
(imagem da net)

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Decreto lei


Reivindico aqui a presença das palavras
que trazes guardadas na tua boca,
e com elas o hálito das flores castas,
e mesmo das adulteradas
por esse desejo libertino
encaixado no palato que,
de vez em quando, o meu ar evoca!

Reclamo também o calor provindo
da pele dos teus lábios e dedos
porque é nesse cetim, macio,
que se deitam os fragmentos
de algodão doce do prazer advindo
dos nossos segredos…

Quero ficar exposta ao perfume
que trazes ancorado ao teu peito
e que, pelo ar navegas em ondas de lume
chispando fagulhas desse doce
emanado pelo teu jeito…

Decreto aqui a lei que te inibe
de ficares longe da minha emoção
sob pena de ficares preso
na distância
que considero ser a tua maior
transgressão!
Rosa Alentejana
25/09/2014
(imagem da net)

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Lê-me a alma na parte côncava das mãos


Não sou senão terra ressequida aguardando as bátegas descaradas das tuas loucuras, nesse arrepiar mundano onde cada torrente de palavras desmedida sacia o vício, mas nunca a sede…

Não sou mais do que sombra escondida na mais recôndita escuridão de solidão, onde o frio instalado anseia o calor do teu sol de devassidão, numa busca interna desse fio forte de luz…

Sou apenas o cálix da rosa, pronta para receber o prazer do teu prazer, nesse misto de querer e autorizar essa partilha ainda antes de acontecer, no verbo prometido, contido, no nosso único entender…

Sou só a batida do coração que és tu, numa combinação perfeita entre o desejo e a aspiração de toques, de sentires conectados nas metáforas das palavras lavradas no céu etéreo e tão terreno…

E sou a porta aberta ao teu entendimento, quando conténs a chave perfeita para esse entrosamento desmedido, cobiçado pelas bocas a arder em poemas, pelas labaredas transcritas pelas mãos, pela sensualidade descrita nas folhas brancas das peles transpiradas…

Silencia essa torrente de versos análogos e respira o ar que me rodeia.

Permite que a emoção descrita nos meus olhos se dispa dentro dos teus.

Consente que as chamas se libertem na fogueira ardente das nossas almas.

Lê tudo isso na parte côncava das minhas mãos!

Rosa Alentejana
24/09/2014
(imagem da net)

domingo, 21 de setembro de 2014

Labaredas


Somos achas do mesmo fogo
quando os sentidos começam a arder
labaredas que derretem a inocência numa fome
que o desejo não pretende esconder
pois, são as polpas dos lábios
o mel doce que nos lambuza
em ternas vagas
quando o nosso olhar se cruza
e se entrelaçam os nossos dedos
num torvelinho de emoções
que nos embriaga, que nos come
em arrepios nas nossas dermes
em convulsões
somos a febre espontânea que nos consome
num mar de ondas
ausentes de medos
a fogueira de palavras que queima
cada poema que o nosso amor
faz nascer!

Rosa Alentejana
(imagem da net)

sábado, 20 de setembro de 2014

Minha quimera


Poderiam as minhas mãos trocar de ofício,
num arrebatamento de palavras insones
da minha triste lembrança,
mas nos meus olhos
ainda se banha o luar prateado
daquela esperança…

Sim, poderiam as minhas mãos
sulcar novos mares, em diferentes fragas,
de sílabas similares, mas os pontos
(na exclamação dos dias)
ainda poisam nos vãos dos mastros
altaneiros dos sonhos invulgares…

Poderiam os meus dedos macerar letras
em pretéritos mais que perfeitos,
mas a preguiça paralela aos leitos onde as deito,
retoma o curso a cada hora,
num compromisso sinuoso
a que chamo de “preceito”…

Sim, poderiam as minhas mãos
ser lagos de águas estagnadas,
onde frases e promessas,
miragens de poesias deturpadas,
encalhadas nas margens da boca solitária,
moveriam desejos obscenos
rumo ao sol nascente da tua capitania…

Mas os retalhos maduros da tua boca,
que se fazem constantemente açucarados,
meneiam fonemas prematuros
que se cruzam com vogais
dos escritos desgastados nos textos
onde descrevo os meus fados…

Por isso, as minhas mãos se embrenham
delicadamente nos ventosos versos dos teus olhos,
na infinita pureza dos teus lábios,
no doce sorriso que ostentas no rosto sábio,
e redijo cada consoante numa caligrafia cuidada,
e manifesto a quimera
na minha prosa aprumada.

Rosa Alentejana
(imagem da net)

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Factível


Ainda sinto a dor desta espera
que me cobre os olhos de escuro
ânimo
que me tolhe as vontades
e que se torna rainha
e impera
sobre todos os sentidos
que lês nas entrelinhas
do que escrevo,
nas palavras ímpias
onde ardo e me queimo
sem saberes, conhecendo tu
as minhas verdades!

Ainda sinto a dor da espera
que se encosta aos meus ouvidos,
num murmúrio delirante,
gemido de desejo pelo meu corpo
errante
por um resquício de beijo
e de abraço
- esse abraço -
(o tal!)
que tanto quero, um só instante
na tua sombra física,
no perfume do teu hálito
morno…

Sim, ainda sinto a dor da espera
enquanto a chuva
passeia pelos meus olhos
e os sonhos vagueiam
pela ilusão
da morte desta sede
com cheiro a terra molhada,
num logro chamado de “sorte”
quando encontrámos,
tantas vezes, a madrugada…

E agora, enquanto sigo o caminho
da estrela cadente rumo ao teu sorriso,
abrigo-me na visão etérea
do teu rosto virtual
e acompanho o passo lento
para esse local
onde as palavras se transformam
em silêncio
numa ótica convencional!

Rosa Alentejana
(imagem da net)

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Sonhas-me?


Meu amor, apenas hoje, peço-te:
Sonha-me

Leva-me aninhada nos teus braços
na escuridão desta noite de lua cheia
e sem compromissos de laços
sente o meu perfume. A que cheira?

À tua ausência o dia inteiro,
ao hálito sofrido da inclemência,
mas que ao mesmo tempo
é tão doce e verdadeiro
como o sabor da minha pele
quando te recebe, inteiro

Deita-me na cama a teu lado
e declama-me poemas de beijos
nos olhos fechados de poentes
tão eternos como os desejos
que sei que sinto…que sei que sentes
neste deserto machucado
a que chamamos de…presente

Brandamente entra-me no vácuo da demora
que teima em soluçar-nos
neste espera tão dolorosa
e pouco a pouco…perde a hora
da noite onde queremos ficar…

Sim, meu amor, esta noite sonha-me
e não me deixes acordar!

Rosa Alentejana
10/09/2014
(imagem da net)

terça-feira, 9 de setembro de 2014

Sinto-te


Sinto-te em cada gesto de ternura
Cada frase, cada divagar, cada lampejo
Respiro o teu amor e esta loucura
Mas não conheço o sabor do teu beijo…

Sinto-te de cor em cada carícia
Cada palavra de profundo desejo
Em cada sonho de pura delícia
Mas não conheço o sabor do teu beijo…

Sinto-te nas minhas mãos vazias
Em cada lugar meu…ou lugarejo
Em cada prelúdio ou sinfonia…
Mas não conheço o sabor do teu beijo…

Sinto-te no meu coração em segredo
Em cada arfar, em cada arquejo
Martírio deste meu degredo
Por não conhecer o sabor do teu beijo…

Rosa Alentejana
15/04/2012
(imagem da net)

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Amor indomado

Categoria : O céu enamorado

Cobre-se o céu enamorado
Com as estrelas da volúpia
No teu corpo despudorado
Que sem saber me arrepia

Vira-me do avesso e converte
Em certo o que parece errado
Por isso, amor, é tão bom ver-te
E ao teu jeito brando e indomado

Que me acolhe… e enfeitiça
Nesse sorriso de meloso mago
Onde me perco e que me atiça

Num tormento quase delicado
De ternuras, mais do que repleto,
De mel tão docemente encantado!

Rosa Alentejana
in "A essência dos sentidos III"

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Futuro


Tenho um fogo meu amor
Tenho nas mãos as brasas
E o sabor desse teu licor
Nos lábios que me afagas

Tenho lume no meu olhar
Tenho a tua graça no ventre
E o sol no teu despertar
Ao sabor da minha corrente

Tens a lua de que falo
Tens estrelas matutinas
E esse tão doce embalo
Nas palavras traquinas

Tens o verbo saboroso
No ato de amor profundo
E esse teu ar apetitoso
Que é todo o meu mundo

Ambos temos este amor
Guardado como tesouro
E o carinho de um beija-flor
No ninho do nosso futuro

Rosa Alentejana

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Cópia de mim


Guardo as mãos no colo sereno
e já os meus olhos não bastam,
para tornar o mundo deste sótão pequeno
no teu mundo,
pois estas sombras apenas te afastam.

Tenho os caminhos das minhas lágrimas sulcadas
neste rosto cansado,
e nos cabelos já sem brilho,
apenas um travessão
da cor do tempo passado.

Sobre os ombros aconchego o xaile arrendado,
para manter o frio afastado,
das noites da tua ausência.

Por companhia tenho os pensamentos,
que embatem nas paredes da recordação,
e o gatinho malhado
que roça os meus pés
numa espécie de consolação.

E do baú com cheiro a bafio e pó
retiro os poemas que te escrevi,
numa dolência com sabor a dó das letras,
sorvo os suspiros que nunca senti de ti…

Passa-se a hora na demora
dos versos rabiscados no papel
a caneta permanente
como eu guardo para sempre
o meu amor por ti tão fiel.

E no desalento da solidão
vejo neste espelho a cópia de mim,
refletida nas paredes
desbotadas do meu coração
e num beijo soprado, que nunca me deste,
sinto que te despedes
da minha triste ilusão…

Agora já posso morrer
pois, o meu tempo nunca chegou,
peço a Morpheu que me leve
para o infinito sonho alado
de quem nunca voou!

Rosa Alentejana
04/09/2014
(imagem da net)

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

O último verso


Se te desse a hipótese de me leres
cada sonho mergulhado nos cabelos
da vida inteira, mesmo os pesadelos
isso alteraria a forma de me veres?

Não, creio que essa não seria a solução
pois, “despenteaste-me os sentimentos”
de uma forma absurda e sinto os gritos
nas veias queimadas de dor p’la emoção

Se te mostrasse a nudez da alma perdida
nas noites e dias no conforto do teu olhar
isso iria provocar uma nova forma de rimar
ou apresentaria uma face desconhecida?

Não, julgo que não, pois despiste-me verbos
e atiraste para longe os véus da consciência
como se não me doesse a tua certa ausência
e fosse fácil para mim encarar esses arroubos

Se te privasse do perfume das palavras redigidas
pela minha mão, isso deixar-te-ia saudades
ou não? Irias querer vencer as dificuldades
ou continuarias com as tuas palavras escondidas?

Não, não sentirias nem um bocadinho
pois, o tempo é algo que não te afeta,
uma vez que as tuas ideias de poeta
continuariam em ti o seu caminho

Mas agora sou essa rima inacabada
que precisa de vogais e consoantes
de um hálito suspirado na pele de antes
para a escrita traduzida da madrugada

um instante frágil, um instinto perverso
no ninho subtil de uma folha amarfanhada
onde a escrita triste, nula e desvairada
seja inflamada até morrer num último verso.

Rosa Alentejana
02/09/2014
(imagem de Paradoxos)

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Renascer


Escuta o som das ondas....
ouve o que dizem elas
no seu gemido constante
quando no desaguar suas preces na areia
que as acolhe
se sentem livres, amadas
num imenso renascer revigorante
como se as suas palavras
fizessem parte de um momento maior
que a entrega nesse instante…

Olha o adormecer do sol…
vê Aquela que se acende no erguer
renascida a cada anoitecer do dia
e reparte do que reflete em luar
rasgos da sua aura sem cobranças,
enquanto os vales e os montes
se esquecem de agradecer
cada toque de magia
vertido nos mares e pontes
em palavras, em lembranças
que cada poeta esconde
no renascer
nas entrelinhas da sua escrita.

Sente a brisa que te bafeja...
afago gracioso como quem deseja
o tatear arrastado, por todo o lado,
o remexer no cabelo despenteado
o fazer sorrir num admitir mais
brisas amenas ou fortes,
alusões ao bom que há de vir
porque a vida é esse vento
alado que nos transporta ao devir
esse abraço descontrolado
de incertezas que nos dá força
para emergir, renascer
sempre
num frente a frente imparável
com o nosso existir!

Rosa Alentejana / Rodrigo Lamar
(imagem da net)

domingo, 31 de agosto de 2014

Lembro-me como se fosse hoje


Ainda te guardo na retina destes olhos morrentes
quando de tantas saudades me choram lágrimas
de rios correntes…

Ainda me lembro bem do teu rosto de papel cândido
que com o tempo se transformará em papiro
único desejo que me foi permitido…

Ainda te vejo naquela esquina, de uma eventual cidade
perdida ou encontrada, no meio de tanta gente, sem ninguém
no breu, ao por do sol, na claridade…

Ainda sinto o formigueiro nas mãos, na vontade de te tocar
um segundo, um minuto, uma hora, o dia inteiro
ou por toda a eternidade…

Ainda os meus olhos brincam na sede daquele contacto efémero
com os teus, misturando as minhas e tuas cores
num arco-íris sincero…

Ainda o meu coração esmorece quando te sonho ao som do tal piano
pois, sei que o teu rosto cria ruas, e os teus cabelos luas
e não conheço os quartos crescentes do teu quotidiano…

E ainda me sento no café onde, naquele dia, nos encontrámos
e bebo o chá quente cheio de fé nas cadeiras vazias
repletas do tempo que nunca desperdiçámos…

Ainda o riso das crianças me chega aos ouvidos e ouço a água a fluir
da fonte da esperança, ali tão perto,
e que continuamos a deixar fugir…

Ainda me lembro…como se fosse…hoje!

Rosa Alentejana
31/08/2014
(imagem da net)

sábado, 30 de agosto de 2014

Sombra


Hoje despertei cedo a madrugada,
derramei-lhe luz pela janela,
aos poucos,
para não a amedrontar

E descendo a rua
descobri que descendo
do clã do sol

Porque ao arrastar
o lençol pelo caminho
abandonei a cama
num banho de luz

mas de que me serve
o oceano do ninho criado
se é de sombra o dia
quando não estás
a meu lado?

Rosa Alentejana
30/08/2014

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Manhã embrumada


Sinto-te no orvalho da rosa
pela manhã
embrumada,
no cheiro a frescura calada
e no sabor a menta e hortelã
no alvoroço da desfolhada

Pressinto a tua mão
no silêncio do afago
e na lágrima chorosa
que me atormenta
as cordas vocais
e não me tocas nem sei do chão
que pisas quando te vais

Pois o meu jardim de horas
alberga a dor da tua ausência
na seiva dos dias que passam
num roçar
da inocência

Por um fino fio de luz
brilhante…nas asas das aves
que esvoaçam
e ainda adivinho o teu sorriso
no arco da íris do teu olhar
quando um beijo meu, sem aviso
nas tuas mãos vai poisar

São sacrilégios ímpares
que me permito
sonhar
pois, de ti sobra-me
o verso escrito
na sintonia
do acicatar

Só não conheço de cor
esse hálito
que tem a esperança
na boca da tua
lembrança
na manhã
de raro esplendor…

E presa ao sereno despertar
abraço o meu corpo
na suave toada
de um violino a tocar
na lonjura de um futuro
sem ti, sem mim, sem nada!

Rosa Alentejana
29/08/2014
(imagem da net)

Respeito


R_ejeito qualquer carícia em forma de palavra doce
E_ tu conheces os beijos de que falam a minha boca
S_ão feitos da atenção encoberta em gesto precoce
P_ousado numa vontade que amaria fosse recíproca
E_rro crasso o da minha imaginação que de matéria
I_nglória se reveste…resta-me a ilusão fantasiosa
T_alhada nas malhas de uma odiosa e triste miséria
O_nde me rendo à única amizade despretensiosa

Rosa Alentejana
28/08/2014

terça-feira, 26 de agosto de 2014

Verdades silenciosas


Hoje amanheceu-me a alma da madrugada
ainda a luz se preparava para desabrochar
por entre as planícies que o rio vinha beijar
numa metamorfose latente, copiosa, ousada

Como os braços de quem escolheu o mar
para desaguar as vontades nessa enseada
de beijos perdidos numa fortuna rasurada
por um infinito de tempo extenso e invulgar

Escalaram-me versos nas ideias sinuosas
do estio, desfiladeiro diminuto do presente,
e não nasceram estevas, papoilas ou rosas

Só brotaram dos dedos empobrecidas prosas
que te ofereço como a única prova evidente
deste desejo e verdades sempre silenciosas!

Rosa Alentejana
26/08/2014
(imagem da net)

domingo, 24 de agosto de 2014

Ah! Esses lábios


É nos teus lábios que eu gozo demoradamente
esse sabor a satisfação completa onde ostentas
fragmentos de atrevimentos, vontades sedentas
que inflamam o meu corpo descontroladamente

E aí me detendo, num deleite feito de lua, fugaz
no céu desse paladar contido, delicado e interdito
como oração casta, num apetecer doce e bendito,
que me morde e flagra o meu gosto louco e audaz

É essa boca o capricho desta minha alma tão pura,
a fonte sábia de tantos versos plenos de devaneio
onde procuro e procuro incessantemente a ternura

de um beijo molhado de desejo e de doida loucura
ausente de calma, de chão, ou de qualquer rodeio
tudo que me faz mulher feita de desmedida procura!

Rosa Alentejana
24/08/2014

sábado, 23 de agosto de 2014

Linguagem do amor


Perguntas-me o que faço hoje?
Pois bem, não te digo o que faço, mas o que gostaria de fazer.

Gostaria de chegar perto de ti e rasgar-te os verbos, um a um…tocar nos pronomes que me enlouquecem com as pontas dos dedos, senti-los nas faces e beijá-los, enquanto o perfume dessa semântica em tons de lua se instala nos meus sentidos.

Gostaria de aceitar os teus advérbios na surdina da nossa vontade, que arde, arde e queima até não mais poder! Porque me enlouqueces, mas fazes-me viver!

Gostaria que fossem apenas de afirmação as nossas vontades famintas, pois já não sinto o medo que o coração semeia e pinta no carmim da pele, sem tintas…

Gostaria que o teu nome me envolvesse a boca delicadamente, sendo esse sabor o único que o meu corpo sente! Sendo a saliva do desespero a rouquidão benevolente patente nos nossos olhos, implorando pelo vocativo…sussurrando aos nossos ouvidos…

Gostaria de derreter-te enquanto sujeito subentendido nas minhas frases, mas sem vírgulas, para que soubesses como podem ser loucos os beijos vindos do “quase” escondido nas fábulas que tantas vezes fazes!

Por fim, adorava que o teu complemento me penetrasse o campo lexical lentamente, sem verbos auxiliares, para que a oração copulativa se tornasse na melhor explosão de poemas invulgares!

Será que expliquei com clareza ou precisas de mais esclarecimentos?

Rosa Alentejana
23/08/2014
(imagem da net)