quinta-feira, 31 de agosto de 2017

Vento na praia


É o vento
que chega
ao rosto
no mês
de agosto
que deixa
o mar
desarrumado
e provoca
o enfado

e os novelos
nas vagas
trazendo
o frio
e o calafrio
quando sais
da água
e incita
os ais
mais
que mais

e a merda
da areia
que levanta
a poeira
que enrola
a toalha
“Deus nos valha”

e chocalha
a cabeleira
arrastando
o guarda-sol
como anzol

e o pé
a escorregar
na pedra
“porra que dói”

e a esteira
a voar
e o banzé
da chata
da criança
que nunca
se cansa
a avançar
para o mar
a guinchar
“não há
ninguém
para a chamar?”

e o tipo
que acende
o cigarro
que lança
o escarro
e a beata
p’ró mar
“havia de
tropeçar"

e a velha
c’o a banha
que ao sentar
cai
de barriga
p’ró ar
“aqui d’el rei”

e a bicha
colocando
o bronzeador
incomodada
c’o a areia
nas frinchas
“que horror”

e o poeta
que chega
e agarra
a loucura
da merda
do vento
e da areia
e transforma
o martírio
do dia
em poesia…

11/08/2017
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

Sede que incendeia


Diante deste mar
tão displicente
aguardo aquele
encontro
tão desejado

esperando não ser
delírio do meu sonho
presente
de uma memória
de um simples gesto
de amor deixado

Mas as ondas
vão revolvendo
a minha praia
apagando as marcas
de pegadas na areia

e eu sabendo
que a minha sorte
não se espraia
apenas inspira
este anseio derradeiro

Acordo e mato na maré
esta sede que o mar
me incendeia!

Rosa Alentejana Felisbela
05/08/2017
(imagem da net)

segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Aprendendo


Maquinalmente
ouço a data
na voz
que canta o tempo

numa cronologia
vaga
acrescento
o registo do encontro
naquele dia, aberto em flor,
que a laranjeira perfumou

enquanto isso
adormeço no calendário
e acordo no domingo
das tuas mãos

-dia santo- feriado

na recordação do primeiro dia
de escola

e eu tão atenta a tudo
aprendendo a soletrar
a palavra amor!

Rosa Alentejana Felisbela
28/08/2017
(imagem da net)

domingo, 27 de agosto de 2017

Desígnio


Encontro-te num verso
numa rima no pretexto
disperso de um texto
que teima e nos aproxima

encontro-te na voz de um til
sobre o coração
no acento apressado
da mão

encontro-te no paradoxo
na metáfora no oximoro
onde a bondade cruel
se deduz num fascínio

e és sempre tu
o meu desígnio!

27/08/2017
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Personal idade


Retira a máscara do coma
em que vives
negligente de ideias
e atitudes

Deixa arder o fogo-fátuo
dos sintomas
de felicidade inteligente

e pede que mude:

o sorriso para a face
o calor para o coração
a força para as mãos
a doçura para a pele

até que um glorioso charme
invada a tua personalidade
fazendo emergir o
que existe em ti:

a alegria de viver!

Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Alma de Ícaro


a alma está engelhada
de sortes lentas
de alegrias longínquas
e risos insondáveis
contando com nódoas definitivas
e encardida de sonhos violáveis

escolhe a lavagem a seco
-sem lágrimas-
recuperando as intenções
de angariar raios de sol
e transformar o tecido
na seda pura de um arrebol

Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Da crueldade do verso


Procuro
o verso perfeito
sonoro
em jeito de rondel
mas sobressai
o punhal
que sangra
o ventre
e me sussurra
na mente:
tu és cruel!

Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)

terça-feira, 22 de agosto de 2017

Brilho

As cores de um vendaval


Prometo-me o banco de jardim
invisível na amargura verde das árvores
e a cegueira do azul do céu
bem como o ponto infinito
na finitude do futuro

desisto do delito da palavra
porque a carrego decepada pela saudade

nunca um espelho foi tão falso
refletindo uma paisagem

fraca condição humana
a de pintar com as cores de um vendaval!

Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Noiva na lápide


Contínuo de luz acesa ao vento e no cimo do outeiro mais uma estrela procurando a manhã
O “até já” inscrito no branco do lírio roxo assinala um passado tão perto que me fere as têmporas
Um choro bravo, um caminho curto e uma luta limitada nos pés calçados com sapatos brancos
Enquanto me recordares não deixo de ser sonho de voltar ao abraço apertado
Enquanto me recordares terei o coração a bater e os meus ossos serão de vontade férrea
Serei sempre a noiva na lápide, o primeiro beijo, a primeira namorada
E a noite será sempre o meu guia de saudade lamentando o tímido adeus
O tempo será de verdade e, à minha maneira, voltarei sempre para ti
Sobrou-me o cabelo negro ondulando à brisa do teu olhar e uma oração por rezar nas nossas bocas
Rosa Alentejana Felisbela
21/08/2017
(imagem da net)


https://www.youtube.com/watch?v=JvHg0eJjFp8

sexta-feira, 18 de agosto de 2017

Beco


É no beco que passas
e cheiras o cheiro
a urina
do chulo
da puta
da sina
dia inteiro
que assina
o preço
e que faz
o serviço
- a cadeia -

É no beco que passas
e cheiras a “passa”
do fumo
do charro
e vês a seringa
do chuto
que singra
nas veias
e odeias
odeias!
a vida
e a sida
- a cadeia -

É no beco que passas
e te assustas
com a rusga
da noite
do bafo
a bagaço
e a bófia
de um salto
assalta
o beco
e leva
a liberdade
p´rá cadeia!

Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

apenas um pouco de ousadia


quando estás para chegar o desassossego marca pontos nas borboletas do meu ventre como se um caçador atirasse a rede e deixasse sair o ar

é então, que os sonhos brancos sobem as paredes do quarto e fica tudo tão claro

até a janela se enche de palavras pequenas enquanto as cortinas
sussurram saudades

enfeito o chão com pétalas rosas que se abrem como lábios sedentos dos teus passos

uma jarra ajeita as tulipas brancas misturadas com sinceridades ansiando o teu olhar

a colcha de tecido macio do pêssego abre os braços para que o teu corpo, em flor, incendeie o tato

o meu vestido perde-se da pele dourada como abelha procurando os favos de mel da tua boca

e quando a porta se abre deixas a ausência presa no trinco do lado de fora: não incomodar

e tu…entras na minha fome de pão ázimo com a faca afiada num suplício manso investindo p’la noite dentro…

Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Tirano


Vens com a força
que tem a trapaça
do mar

recolhes-te à duna
à doca à escarpa
e beijas com a espuma
as cordas do cais
âncoras
areais
ânsias
ais

recolhes-te ao fundo
negro
do cetro de Neptuno
onde és rei
e arrastas as metades
solitárias
num gesto profano
que nada
tem de humano
mas de vil monstro
tirano!

Rosa Alentejana Felisbela
12/08/2017
(imagem da net)

terça-feira, 8 de agosto de 2017

Simplesmente sem perdão


Fome. Tanta fome nas mãos:
de gratidão,
de amor, de frontalidade…

Comem-se amargamente
as letras ensopadas
de certezas. Uma pitada
de melancolia tempera a vida
- sem sal -

O descuido transborda
na panela que consola “online”
e os “usuários” lambuzam-se
na oração que precede a refeição:
a cruz fica no rosto
em sinal de fé
- perdida -

Por fim, mais um poema
na arte peregrina
da vida.

Os joelhos ensanguentados,
as palmas das mãos doridas
de tanto tentar expiar os pecados…

E tudo justifica o silêncio
- sem perdão -

Rosa Alentejana Felisbela
06/08/2017