segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Soletrar? Não, obrigada!


Nunca gostei de soletrar. Era uma mania que eu tinha, ler a palavra de uma vez. Se fizesse pausas, corria o risco de não dar a entoação que a dita merecia e perdia o fio condutor do discurso que lia. Sempre fui de começar para terminar rápido. Com todas as ressalvas que merecem as pressas (a minha mãe dizia-me que “depressa e bem, não há quem”, e eu pensava “deus não pode estar em todos os lugares, por isso fez as mães”, mas ficava com a minha mania). Depois da leitura vinha a pressa para reproduzir às minhas amigas o que havia aprendido, mas elas não seguiam os mesmos pensamentos (tinham outros interesses) e lá ficava no meu cantinho sozinha. Quando me tornei adulta continuei com esta pressa, e por isso comecei a escrever, com a raiva de quem se esqueceu de falar. Agora grito com as palavras o que o coração foi privado de dizer, mas a minha voz só chega aos corações preparados. Não há maior ternura que receber as palavras na caixa do correio do coração, sobretudo de quem é verdadeiramente amigo e não se deixa levar por qualquer mesquinhice passageira. Serei sempre aquela menina cheia de pressa para entoar, sobretudo, a palavra AMIZADE!

Rosa Alentejana Felisbela
29/01/2018
(imagem da net)

quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

Prestes a detonar


Embrenho-me
dama dos meus dramas
na trama dos pensamentos
- castelo das minhas ruínas -

e sinto-me protagonista
de cada instante
- último ato da vida -

escuto a flauta alada
de mão em mão
nos ramos dos cedros
anões

com os ouvidos colados
ao vento - rufia do tambor
que rufa revoltas covardes -

escuto Pan do Demónio
que amua ébrio de vinho
- o esquecimento perfeito
e preferido -

e olho e vejo
a Civilização Canalha
que encaixa a cangalha
dos incêndios florestais
e outros “quetais”

e sinto a luz escondida
p’lo cortinado corrido
em janela de luto
p’la fome e p’los funerais

dispo-me da Impostura
e vomito o raciocínio
macabro, depois abro
o coração à Opinião
Pública

ela que é cega e bruta
abraça-me com a compaixão
do momento
segurando o estalo virtual

Afinal, há um mapa sem estrada
inscrito a bold no meu coração
e chama-se Portugal - meu pai -
a Bomba H
prestes a ser detonada!

Rosa Alentejana Felisbela
18/01/2018
(o Cedro de Lamartine, um tronco de cedro seco esculpido pelo artista plástico Rudy Rahme em 1992 depois da árvore ter sido atingida por um relâmpago)

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Vês?


Encontra-me na trama
do milho, da rama
da rega que alaga
a raiz

e faz-me menina
e ensina-me
a ser feliz

por um momento
por um segundo
sê do amor – o mundo

o abraço fecundo
tão nosso tão poderoso

que todos os sonhos
resumidos, presumidos
se encontram

de uma vez
assim…
vês?

Rosa Alentejana Felisbela
12/01/2018
(imagem da net)

domingo, 7 de janeiro de 2018

Nevoeiro


E saio
uma mão cheia de sonhos
os pés na eternidade
de um caminho
de nevoeiro... só!

Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)

Porta envelhecida


No solstício do verão
abriu-se a porta

Julgaste a saída
no Tribunal dos Afetos
- culpado -

E no inferno
da espera cortaste o elo
da lembrança
com a tesoura torta
- inspiração entrecortada -

Desabitaste a voz
vestiste o fato do silêncio
e perdeste os passos
nas ruas velozes

Suicidaste a saudade
no precipício das manhãs

Sempre o esperaste
ressuscitado e amoroso
mas a sua imperturbável
morte perseguiu-te…

De longe embarcaste
na barca da insónia
gemendo a dor
que as unhas arranhavam
na pele do peito

O teu amor foi esquina
de mulher perdida
nua de espírito
- coração feroz -

Agora é solstício de inverno
nos gonzos da porta
fechada, envelhecida
p’la escuridão

Rosa Alentejana Felisbela
07/01/2018
(imagem da net)

sábado, 6 de janeiro de 2018

Entendimento


Nos dias cinzentos
uma brisa fria
amordaça
o silêncio

e o sossego da ria
de certo
ameaça
o pensamento

o leve som
- solitário? -
dos passos

as mãos
perfumadas
nos cabelos

são farrapos
de saudades
- um entendimento -

entre as gotas de sal do ar
o sal da pele
e o sal dos olhos
por um momento…

Rosa Alentejana Felisbela
06/01/2018
(imagem da net)

Desconforto


As boas atitudes
irão perdurar
perante o tempo

sem arrependimento

mas a mágoa
da palavra

voa e pousa sobre
o fio de arame
que é farpa

e fere e morde
e arranha
a sorte

não há lamento
que conforte
um ser

Rosa Alentejana Felisbela
06/01/2018
(imagem da net)

sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

A meia


No tacão alto
o desacato
da meia

a malha perdida
da cadeia
que torneia

a perna
bem feita

e o olhar caído
do homem
que anseia…

o rasgo
o jogo
o fogo

que ela ateia…

Rosa Alentejana Felisbela
05/01/2018
(imagem da net)

quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

A regra d’escrita


Sempre que te escrevo
na minha forma barata,
simplificada

e pronuncio o teu nome
nas minhas letras
insones

há um eco doloroso
que se evola
nas reticências aladas

e rasgo a ferocidade do ar
com que te toco
num dedilhar de harpa
ou num sopro de saxofone

e tu nem sonhas a febre
que me verga
e me consome!

Rosa Alentejana Felisbela
03/01/2018
(imagem da net)

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Despedida


Nada do que é dito
é escrito
nas folhas em branco

nem a prova
nem o solavanco

e o rasto que fica
é laço

é espaço…tão longe

é marca
da roda que é vida

e retrocede
no cansaço

que não tem despedida…

Rosa Alentejana Felisbela
02/01/2018
(imagem da net)

terça-feira, 2 de janeiro de 2018

O primeiro dia do Ano


O GPS levou-nos diretos
A este lugar de encanto
Gostámos dos doces afetos
Cozinhados sem engano ;)

“O Melidense” matou a fome
Destes dois caminhantes
Jamais esqueceremos o nome
Que eternizou instantes

Não sei se gostas de migas
Ou outro tipo de petisco
No Alentejo nunca digas
“ah e tal não gosto disto!”rsrs

Este foi o prato comido
No primeiro dia do ano
Em Melides ficarias rendido
Ao “menu” alentejano rsrs

Até a mousse de chocolate
Deixou os sentidos delidos
Tudo feito com tanta arte
Que ficámos logo rendidos rsrs

Ainda por cima com humor
Desde as paredes aos lavabos
Tive a “assistência” de um senhor
A olhar para sexos e rabos ahahahahha

Havia o largo da igreja
Cheio de livros para ler
E rezei para que não seja
Só de pedras o meu entender rsrs

Depois havia a beleza do mar
De vagas brutas e barulhentas
E uma enorme vontade de passear
Pelo areal de águas bentas rsrs

Foi assim que se passou
O meu início de ano
E o teu com o que contou?
Foi mais marinho ou serrano?

Rosa Alentejana Felisbela
02/01/2018

segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Novo Ano


É nas palmas das tuas mãos
que repousam as neves
qual penugem de algodoeiro

É na íris dos teus olhos
que descansam leves
as cores das folhas do sobreiro

É no céu da tua boca
que me sinto a borboletear
louca em rodopios de ternura

É na carícia da tua cintura
que o movimento do olhar desfoca
e me sinto a levitar

É quando desenredas
o enredo, que desvendas o meu
segredo, que me sinto arquejar

Pois, abre depressa o presente
faz o que nos passa p’la mente
desfolhando os dias do ano…a sonhar!


Rosa Alentejana Felisbela
01/01/2018
(imagem da net)

A pensar…


Entendo que os anos passam, que as pessoas mudam, que os locais por onde passámos nunca ficam iguais, o que vivemos não volta a ser vivido. Importa que tenhamos desfrutado da melhor forma. Mais do que isso, compreendo que precisamos de nos distanciar dos acontecimentos para os “vermos” com clareza. É assim que vejo o que fiz, as escolhas que tomei como minhas, e as consequências também. Aprendi muito. Se voltarei a errar? Sim, claro, não sou infalível. Se volto a fazer da mesma forma? Não sei. Se errei, não! Se quero as mesmas situações? Talvez não. Talvez me canse e diga “chega”. Só tenho a certeza do amor (amor de mãe, amor de filha, amor de mulher, amor ao próximo…). É ele que me move! Ele e a esperança que nunca morre, que fica guardada no bolso de trás, para qualquer eventualidade…Bom Ano de 2018! Sejam FELIZES!

Rosa Alentejana Felisbela
01/01/2018