terça-feira, 31 de janeiro de 2017
gotejar
A melodia da chuva
chora o esboço d’um poema
de amor maduro e triste
caído nos beirais da ilusão…
E julga o poeta que a saudade
são gotas pequenas
miudinhas…
Mas é gotejar de silêncio bebido
em largos tragos
escritos nas suas mãos!
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)
domingo, 29 de janeiro de 2017
Céu
Brando álibi
Quanta fome de justiça
comem os olhos e as mãos
quando te roubam a sorte
- omissa -
e a verdade sobeja
sem razão…
Quanta falta de amor
amarga nesse peito sozinho
sobra o medo e o terror
na ausência
de um carinho…
Perdeste o tempo de liberdade
perdeste a tua alegria
criança
és adulto sem mocidade
o que te fica na lembrança?
Um choro um grito uma falta
duas bocas a alimentar?
Quantos tiranos malditos
quantos muros a derrubar?
Que te ajude a humanidade
perdida no seu umbigo
-na sua própria orfandade-
brando álibi para te colocar
em perigo…
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)
sábado, 28 de janeiro de 2017
O pecado da gula
Quanto tempo falta para saborear o meu doce preferido? Esse poema mascavado deixa-me sempre a salivar… Tem que haver a noção de que não basta misturar os mesmos ingredientes, têm que ter as porções ideais. Talvez tenham que ser íntegros e puros, de colheitas verosímeis e francas. Eventualmente não pode faltar o cuidado das mãos e a paz de espírito, substância fundamental para o resultado final. Provavelmente tem que haver um pré-aquecimento, mas se deixarmos em banho-maria eternamente, pode ferver demasiado e a água entra…É importante lembrar que derreter o açúcar, de que são compostas as frases, exige calma e sapiência, ou pode queimar-se! Porém, há que alimentar o fogo e saber quando está no ponto, pois a vida é tão curta… E se for servido com glacê tanto melhor, desde que beneficie apenas os meus lábios…não suporto partilhar, sofro do pecado da gula!
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)
sexta-feira, 27 de janeiro de 2017
O canto alentejano
O canto das terras sem sombra tem planícies a perder de vista, e combina a paisagem com o sol, numa “moda” dolente que encanta quem passa. No recorte do horizonte podem ver-se os sobreiros, as oliveiras, os miradouros, as muralhas dos castelos…Há uma pureza doce de suspiro, no branco mouro das casas térreas, e sopros de memórias nas ruas empedradas. De vez em quando, o perfume da flor da laranjeira assalta-nos os sentidos, produzindo um constante assombro! E os recantos guardados entre as praias fluviais e os eucaliptais tornam-se oásis para a descoberta dos amantes. Até as constelações se tornam mais visíveis nas noites alentejanas, propiciando a contemplação e o romantismo. O som rumorejante dos rios vai abrindo caminhos entre os penedos, na sua busca de mar…Mas quando nos aproximamos do litoral, mergulhamos num azul que inunda a íris, beijando os areais, as escarpas e arribas. Quanto ao paladar, abre-se perante os pratos mediterrânicos, sempre regados pelos vinhos de castas privilegiadas por terem “uvas beijadas pelo sol alentejano”.
Site consultado: https://www.visitportugal.com/pt-pt/destinos/alentejo
Afagos da natureza
Perante o som confesso
da água cristalina a correr
fecho os olhos, adormeço
sinto sem realmente ver
Ouço o som dum avião
ao longe, num ronronar
e acho que é o coração
baixinho, a sussurrar
Ouço o melro e o pardal
uma cigarra e um grilo
certamente no matagal
que sinto e sei tranquilo
Ouço o vento na azinheira
apressado no seu passar
quero entrar na brincadeira
levantar-me e ir cantar
Mas os olhos ficam fechados
numa calma que não se apaga
quero os sonhos bem guardados
enquanto a natureza me afaga
Rosa Alentejana Felisbela
(para escutar)
https://soundcloud.com/user-135078890/programa-o-canto-alentejano-25012017
Sabes?
quinta-feira, 26 de janeiro de 2017
caixa de música
quarta-feira, 25 de janeiro de 2017
Relicário
Cava a fertilidade da terra
-mornos lábios
que encerram segredos-
e semeia grão a grão
desejos voluntários
com a tua própria mão
colhe o vento e desfaz
as nuvens - gota a gota-
que a sede é colo
-precário- para as hastes
verdes de ilusão
ilumina o orvalho
com o sol do teu calor
e recebe o fruto desse amor
num terno abraço
- eterno relicário!
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem Vincent van Gogh - 'Le Moulin de la Galette')
segunda-feira, 23 de janeiro de 2017
metamorfose
quinta-feira, 19 de janeiro de 2017
Alentejanices...
Lembri-me agora duma coisa p’ra contari…isto quondo agenti nã tem que fazeri, enventa! Quondo é era moça, gostava de m’assentari à roda do lumi com’ás ôtras, porque tava entenguida com frio, e nem mangando é qu’ria sairi. E quondo a minha mãe mal se precatava já é lá tava, nã qu’ria saber de moengas! S’eu gostava de mangar com as minhas tias e comeri o panito torrado e buber o chcolate da ch’clolatêra! Até me esgadanhava por aquilo! Nunca gosti cá de descabeches, mas os meus primos faziom as minhas avós andarem em fezes…elas até d’ziom qu’eles deviam andar à pergunta do siso em vez d’andarem atrás das moças, que isto “quem faz uma panela, faz um testo p’ra ela”, mas eles…faziom-nas assomar à janela e bradar do rijo “Oh Maneliiiiiiiii, oh Antóinoooooo, venham cá (moços dum cabrão)!!” Até eu d’zia “É tléi, isso diz-se??”, e era uma barrigada de rir, tava o balho armádo! E eles ali perto, no pial da v’zinha, mandando bêjos às maganas, à espera duma melhadura ou qu’elas mostrassem um cadinho quanto mal das alpercatas…parvalhões! Às vezes d’ziom “nã me moias, vai-t’embora”! E eles lá voltavom, como se viessem d’emplão, todos envergonhados! E à hora da ceia lá estávamos todos juntos à mensa, comendo uns caces de sopa e eu mangando com eles. Mas depois ia-me dêtari cedo mond’a escola no ôtro dia e já tinha à vondo de tanto riri…
Que sódades destes tempos!
Rosa Alentejana Felisbela
19/01/2017
quarta-feira, 18 de janeiro de 2017
Lareira de contos
Quando o dia termina de mansinho e a escuridão se instala nos cantos da cal e nas concavidades das paredes salitrosas, a cadeira de bunho suspira pelo meu corpo cansado. As costas de madeira, já puída pela quantidade de vezes que aconchegou as minhas costas, rangem a sua saudade. As labaredas produzem o calmo crepitar da cozedura do jantar (único perfume acolhedor que se espalha pela casa) e o fumo tisna a parede e a panela que o ferro forjou, enquanto os meus olhos demonstram a sua pequenez. As minhas roupas gastas, porém limpas, acariciam-me a pele enrugada da velhice. Tenho as mãos trémulas sobre os joelhos, segurando o livro de contos (oferta da minha nininha, que morreu vítima da idade que o tempo amarrotou). Em tanto procuro a sua voz e entanto vou perdendo a capacidade de a ler e encontrar nas letras…Solitário da luz do candeeiro a petróleo, como as sopas que as horas amargam e deito-me com a doce lembrança das rimas que os olhos da minha nininha me declamavam. E a saudade adormece-me agasalhado por mais um poema, quente com a manta da noite.
Rosa Alentejana Felisbela
(van gogh farmer)
terça-feira, 17 de janeiro de 2017
noturno de Chopin
Mágoas marginalizadas percorrem caminhos imaginários através das vidraças da janela, numa azáfama desorganizada por um vento a soprar sem parar. O gato enrosca-se junto à janela, aborrecido e sonolento, mas levanta a patinha para tentar agarrar alguma gota distraída. É ele o prisioneiro da solidão, o carente de afago, o pária do amor. Através da janela demarca o seu território de pensamentos, por vezes perversos, de versos libidinosos, mas sabe que não passarão de palavras sem pelo a roçar noutro pelo, sem o bafo quente de outro bafo no seu. Daquele lugar ele sonha o cio concretizado no olhar felino de outro olhar, mas sabe que a semântica será sempre metafórica, exacerbada, um pleonasmo sem par. Lambendo os pelos, consome as feridas abertas do amor-próprio convertido em autossatisfação, como se a língua rugosa pudesse lavar o seu melífluo coração, coberto de insígnias de saudade. Apenas Chopin insinua um trilho de lua, um noturno triste como banda sonora aos seus ais miados. Mas, ainda assim, mantém-se na sua clausura de tormentos onde os membros não podem dar asas à sua vontade, onde as articulações continuam presas virtualmente e as garras recolhidas para não melindrar ninguém. Por fim, o gato adormece e sonha. Sonha com a liberdade de bigodes ao vento, criando poemas de sol, palavras de chuva, comendo sentimentos sem morrer de fome, mordendo solfejos de amor e dormindo ao relento. Sonha…ainda.
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)
segunda-feira, 16 de janeiro de 2017
Meninice
Olhar garço e moço
tem esse teu rosto
-menino do povo-
De caracóis teimosos
e coroa emaranhada
-bosques faustosos-
meu “príncipe do tojo”
do reino da sorte
tão endiabrada!
Tens aventura na boca
com sabor a mosto
dos cachos das uvas
que guardas nos bolsos
-essa sede mata?
Tens a camisa rota
presa na ternura
que o arame rasga
e os calções marotos
não tapam a ferida
de correr p’los campos
travando batalhas
que a imaginação pressente
e a alegria desata
Meu menino d’agosto
que afogas no rio
o rubor da fuga
que a traquinice afaga…
guarda em ti a prata
que a meninice
-valioso tesouro-
é fogo fugaz
que num repente apaga!
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)
domingo, 15 de janeiro de 2017
(a)mar(te)
sábado, 14 de janeiro de 2017
véu
Aportar
Voa-me o olhar sobre as águas
toldadas, trémulas, tumultuadas
e rendidas ao vento
Meditam-me ideias alheadas
seguindo em barcaças secretas
p’lo destino paralelas
tentando descobrir o valimento
Contemplo o rumo mudo
incerto
e quero a âncora e a amarra
que o nó uniu e não dilacera,
a verdade que nos move
num aportar liberto!
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)
sexta-feira, 13 de janeiro de 2017
reescrita
quarta-feira, 11 de janeiro de 2017
eco
indizível
Há um pudor indizível
na alma
quando o sol se esconde
sob o véu diáfano
de uma manhã
E aquela nota nua
que entoa
intangível
uma emoção…
Cruzar de dedos
em torno das nossas mãos
-amo-te-
Reflexo involuntário
no espelho
da água presa ao chão
Inspirar venturoso
em arrojada fruição!
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)
terça-feira, 10 de janeiro de 2017
frio
nevoeiro
Nevoeiro carregando
a madrugada
-emparedada, sem sol-
um tic-tac apressado
abrindo os ponteiros
- demasiado ligeiros-
e a claridade baça acesa
-janela afora-
condensando suspiros
os passos traiçoeiros
pisando
a calçada, passando
o golpe incisivo
na pele desnudada
e o corpo a diluir-se
na aragem empedrada
da rua
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)
domingo, 8 de janeiro de 2017
"Bouquets" naturais
Bem sei que a primavera se foi,
que os olhos das nuvens choram,
pois aquela tal partida nos dói,
mas olhai os malmequeres agora:
estão viçosos, de caules verdinhos
e as pétalas branquitas e amarelas
parecem "bouquets" unidos sozinhos
autênticas pinturas, perfeitas aguarelas
tão inocentes nos ficam olhando
de pestanas abertas, sem medo
que nascem até junto ao penedo
para lá das cercas, do olivedo,
e eu encantada digo “credo!
Tanta beleza por dentro vibrando!”
Rosa Alentejana Felisbela
(fotos minhas)
sábado, 7 de janeiro de 2017
Abraço
quinta-feira, 5 de janeiro de 2017
Da origem do amor
Dos raios solares do teu olhar
nasce o calor acolhedor
da seiva morna nas faces
e as caldeiras acesas das veias
aguardam esse vulcão do ventre
que incendeias num quase… transbordar
Do relâmpago da tua voz
nascem os suspiros de vento
e os nimbos solitários
ponderando as tardes de chuva
benigna e redentora
polvilham o firmamento
de sombras de tarde viúva
Das montanhas dos teus dedos
nasce a ternura de cada fonte, rio e mar,
e quando acaricias cada vale e cada monte
é como se percorresses horizontes
acariciando da terra a fertilidade
O limbo do teu corpo
é nascente das torrentes de orvalho
que o prazer demanda
na barragem das cores urgentes
que a primavera eclode
em éclogas de canções de amar…
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)
quarta-feira, 4 de janeiro de 2017
"Liberato"
Trazes olhos de pantera
- negrume na noite felina-
passo lento, sensual
roçar suave que fascina
sorriso puro, angelical
a voz doce
embriaguez
as mãos são bagos dourados
-ofertas de insensatez-
vertes no cântaro o mosto
do amor
que depões a meus pés…
colhes da solidão a parra
acaricias a gavina
mordes a uva
da mudez…
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)
segunda-feira, 2 de janeiro de 2017
desfloradas
domingo, 1 de janeiro de 2017
aguardo
Aguardo que me guardes
na tarde entardecida
que o sol beija no horizonte
em despedida
Aguardo que os desejos
voem como balões coloridos
rumo à esperança
para um dia serem cumpridos
Aguardo os sorrisos
proporcionados pela companhia
reconhecida e amada
do “amor próprio”, que m’alumia
Aguardo a alforria da alma
e o segredo que o tempo
companheiro inseparável
reclama!
Rosa Alentejana Felisbela
(imagem da net)
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