quinta-feira, 7 de maio de 2020

ovelha negra

Tenho o pasto rasgado ao meio. De um lado, quem remói exasperado tudo o que digo. Do outro, quem fica fascinado com o que não digo. Ser ovelha negra nunca foi o meu propósito. Foi um ar que me deu, ao nascer. Não suporto que venha o pastor e me mande para outro lugar, porque eu mando-o pregar para outra freguesia. Posso não ser suficientemente rápida. Engulo o sapo, porque às vezes tem que ser. Mas depois solto a língua, e qual víbora, ferro a gosto, de cima a baixo. Marrar comigo não dá resultado, nem me dou a esse trabalho. Sou capaz de virar a cauda e deixar redondinhas mágoas só para alguém saborear. Não sou mole na carne, já sou velha no saber. Mas o sabor, só quem sabe, pode dizer…Deixo os “carraceiros” desparasitarem o meu pelo, porque me dão asas para voar o que eu pretendo. Não uso ninguém em meu proveito. Mas aproveito o que me querem dar. Sou livre de querer. Como o pasto sem dono, para não dever nada a ninguém. Ninguém me sustenta e eu sustento quem me ama de verdade. Refiro-me também à amizade. Meus amigos, está a ficar calor, talvez me deixe tosquiar, mas para mim ficará o cobertor. Tenho a quem o ofertar, e passa-me o calor.

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
07/05/2020

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