quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

“Me faltas”


Quantas vezes estivemos sentados neste lugar, de frente para o “nosso mar”, sabendo-o cheio de tormentas para acariciando-o com o olhar? Nunca me disseste em que pensavas, deixavas-me adivinhar…
Tu, talvez a creres ser sempre a última vez. Eu a acreditar que te renovaria e ali voltarias comigo sempre…Sonhava. Alguns sonhos são de realizar. Outros são de abandonar. Mas eu nunca te abandonei.
Quantas vezes te perguntei o nome de uma ave, que tipo de peixes viveriam naquela escuridão. Mas, tu contavas-me o que sabias, porém mergulhavas na tua própria escuridão.
Quantas vezes quiseste ir ver “a altura” que a água tinha? De dentro da tua memória, afirmavas com a certeza de um sábio, que a barragem já tinha estado mais cheia.
Cheia de lágrimas ficava o meu e o teu coração, cada vez mais unidos, cada vez mais separados.
Quantas vezes te pedi que cantasses comigo a canção da água, mas tu já tinhas perdido a sede e só ouvias o som amargo da foice a cortar, cada vez mais perto…
Quantas vezes te disse, agarrada ao teu braço e de mão enlaçada na tua, que ninguém nunca nos roubaria aqueles momentos. Aqueles em que os peixes saltavam e voltavam a mergulhar, aquele voo picado do pato bravo rasando as águas, ou o piar dos pardais a cantarem canções de despedida…
A despedida chegou, e foste embora, meu porto de abrigo…E foi tão turva como as águas que a barragem tem em dias sombrios.
Hoje, estava um desses dias, mas eu senti um raio de sol a evaporar as minhas lágrimas. Deixei-as no fundo da barragem. Porque era assim que me querias, com um sorriso no rosto. Amo-te tanto pai!

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
29/01/2020

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