quarta-feira, 6 de maio de 2020

Maldições


Para que servem os cantos, iluminados de luz e sombras, se não passas pela minha calçada?
Se eu subo ao candeeiro de olhar imaculado e volto borboleteando sabendo que estou enganada?
Consomem-me os declives, desnivelados nos tacões, que escorregam e nem vês que abalroas corações?
Há sempre uma torneira que reserva a água para o fogo, que o diligente bombeiro apaga na boca do lobo…
Batem as portas dos contadores da luz e da água, sob o vento aterrador da tempestade da mágoa.
Condeno os alarves beirais que, conhecendo o meu pescoço, deitam gotas de saudade sobre o meu alvoroço.
Acendo uma vela vistosa por dentro da janela da sala, indico a jarra à rosa e uma música que a embala.
Viro-me de dentro para fora, num momento de trovoada, até a luz do relâmpago acende a minha triste madrugada.
Maldigo os degraus sinuosos, pelo tempo que tem passado, ajoelho a oração, seguro a faca aguçada.
Pelo sinal que faço da cruz, rogo-te um cigarro aos lábios, sopro incenso de morte, no meu hálito de beata.
Não fumo a pouca sorte, nem é o teu amor que me mata.
São as horas que fico catando, como mãe os cabelos do filho, num tapete ou numa manta, amortecendo o teu trilho.
De que me serve a alcova, se não queres o coração? Ainda assim, aguardo que chova e lave todo o meu…perdão.

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
06/05/2020

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