quinta-feira, 21 de novembro de 2019

Até um dia ter coragem…


Havia no largo da aldeia, uma fonte de água cristalina e fresca. Era nela que os pássaros matavam a sede. Em volta dela, as abelhas zumbiam a sua azáfama. As libelinhas volteavam as asas transparentes. E ela, borbulhava de mansinho, afagando cada um, qual mãe abraçando os seus filhos, cheia de carinho.
Quis o destino que a moça do xaile colorido, de rodilha na cabeça para segurar a quarta de água, passasse para encher a sua bilha. Nesse momento, um casal de pombos arrolhava o seu amor, num banho de asas tão entusiasmado, que salpicou o rosto rubro da moça. Os seus olhos negros sorriram e a sua boca de lábios generosos soltou uma bela gargalhada. Enquanto isso, ela dobrou o corpo no seu vestido feito de pano barato, colocou a quarta de barro sob a fonte e sentou-se na beirinha, aguardando que enchesse. Brincava com os caracóis negros sob o lenço e os bolsos do avental amarelo, de onde retirava pequenas migalhas de pão, que distribuía com os dedos longos das mãos macias e caridosas, pelos pombos que ali apareciam. Balançando os sapatos modestos, afastava os pensamentos para longe. Uma melodia surgiu-lhe na voz encantadora. Como água pura, confundindo-se com a mesma nascente, ela deleitou quem a escutava. Por fim, pegou na quarta, ajeitou o xaile e a rodilha, mulher feita e desembaraçada, e foi subindo o outeiro a cantar até chegar à casa pequena e simples que lhe servia de moradia.
O rapaz de pele bronzeada, de chapéu de palha sobre os olhos morenos, continuava sentado por baixo do plátano ali defronte. Com os dedos de unhas sujas, continuava a atirar pedrinhas para dentro de um buraco feito com a parte de trás das botas gastas. A camisa de quadrados arranhava-lhe o corpo contra a casca da árvore. As formigas entravam-lhe pelo colarinho desgastado e picavam-lhe o pescoço e a pele onde a barba começava a despontar. Mas ele estivera mais atento à rapariga, do que ao carreiro das formigas. As calças de bombazina, abertas nos joelhos, deixavam entrar o sol. E o rapaz levantou-se sem coragem para lhe dirigir a palavra. Ficou a vê-la subir o outeiro. Mais uma manhã que guardava nas recordações mais belas da sua vida. Afinal, não existia essa coisa do destino. Ele fazia-o diariamente. Até um dia ter coragem…
Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
21/11/2019
(imagem da net)

domingo, 17 de novembro de 2019

Degelo


Raios de sol refletindo
Arco-íris derramados
Campos de gelo luzindo
Bancos de neve parados

O vento frio passando
Pela imensa superfície
Sem saber vai cortando
Fazendo qu’o degelo inicie

Animais desorientados
Buscam outras paragens
Muitos são assassinados
Pela culpa dos homens

Alguns ingerem plástico
Outros presos em redes
Clima que era fantástico
Vira anúncio nas paredes

Às vezes dá desânimo
Viver nesta imensidão
De homem tão magnânimo
Que não vê com o coração

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
17/11/2019
(imagem da net)

sábado, 2 de novembro de 2019

A poesia das coisas


Ela via além dos objetos opacos, das flores delicadas, das paredes salgadiças, das vozes presentes. Bastava-lhe um olhar mais demorado, e crescia-lhe a fome de utilizar as palavras.
Uma caneca envelhecida de tantas lavagens, descascada no local onde tantas bocas beberam, com as suas cores desbotadas, não era um simples objeto opaco. Era a taça da criança mais amada numa família, a mais utilizada para beber o leite retirado diretamente da vaca. E quando o sono a visitava, nos braços da sua mãe, a criança segurava-a nas suas mãos pequeninas e bebia até adormecer.
Quando os seus olhos de verde seco pousavam nas rosas alaranjadas, sabia, antecipadamente, que fora o pai de uma numerosa família, que tratava de jardins enquanto fora emigrante, que trouxera as podas e as semeara debaixo da janela da sua esposa, para que, ao amanhecer, sempre que a abrisse, o perfume envolvesse os seus amados sentidos.
Os seus olhos alagavam-se de lágrimas pelas paredes salgadiças, por resistirem à enorme trovoada que abatera o teto daquela casa. Ela que abrigara os berços de dois meninos, chorando de fome durante a noite, juntamente com as lágrimas dos seus pais, por nada lhes poderem dar de comer. Por isso, ficaram salgadiças e os ratos tiveram a oportunidade de abrir buracos de um lado ao outro.
Bastava uma palavra trazida pelo vento, para que ela soubesse que em algum lugar, um rapaz de nariz sujo e rosto tisnado apanhava uma sova do padrasto por não ter trazido mais dinheiro em esmolas para casa.
A sede das sílabas diluídas num dicionário imaginário, levavam-na a pingar frases e frases sobre as folhas de papel reciclado. Tudo lhe matava a fome da escrita. Até que um dia, perdeu a transparência do olhar, as pétalas secaram, as paredes caíram e as vozes silenciaram. E ela soube que os seus olhos cairiam no chão, sem brilho. E que a sua caneta repousaria, sem tinta, para sempre, sobre o papel reciclado.

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
02/11/2019
(imagem da net)

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Estou tão cega de momentos...


Estou tão cega de momentos, que não reconheço a poesia dos poentes. Persigo a escuridão da terra, lavrada de estrelas que já partiram, e só escuto o sussurro das pedras. Elas conhecem o segredo, guardado na bebedeira da bruma. Ele escorre por entre as águas partidas em mil vagas, galgando desfiladeiros em busca da tua foz. Mas eu só encontro precipícios bem no fundo da solidão. É de corais a voz gritada das baleias no cio, mas é de areia a fria mordaça de limos escorregadios dos pensamentos. Bastaria uma ponte no meio do oceano, para a calma reinar nos passos da gente. Caminharíamos rumo ao porto, ancorando os corações com cordame do amor lasso. Apenas porque não suportamos aprisionamentos. Quem sabe se depois, não partiríamos rumo ao mar alto, lado a lado, transportando nas mãos a última rosa verde? Não culpemos a brisa que não se fez vento forte para nos agitar as águas. Há uma luz vinda do farol enraizado na terra firme. Sabemos por onde navegar. Vivemos perplexos no nosso reflexo apesar das rugas da saudade. Olhemos, pois, para o horizonte ainda quente do último beijo. Deixemo-nos embalar pela melodia da eternidade. Contudo, deixa-me acordar os olhos para reconhecer a poesia dos poentes…

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
14/10/2019

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Frio


Era o frio. Aquele frio que se entranha na pele, que nos gela as veias e congela o coração. Um coração demente, amargurado, dormente. Era um frio medonho, escuro e silencioso. Propagava-se pelo espaço exíguo do quarto. Agarrado às paredes, trepava até às janelas e derramava-se pelas ruas. Cada candeeiro possuía a sua aura tétrica num plano puramente elevado. Um vento agrestemente cortante sublinhava as frestas das janelas e portas. Além dele, só o ruído das lágrimas cruas, que me galgavam os olhos como rios turbulentos, se ouviam. Ao longe, a lua, no seu rosto branco e belo, comentava com as suas crateras, que a tristeza precisava de um pouco de sol…

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
07/10/2019
(imagem da net)

terça-feira, 1 de outubro de 2019

o calor da palavra


Quem dera sentir o calor da palavra
sobre o tom mudo da pele,
nem que de um suspiro se tratasse
beijando a nuca de verde.
Subindo a árvore do consolo
ramo a ramo matando a sede
e, por fim, entornar no teu colo
o poema de pêssego profano
sentindo o brilho dos teus olhos ao ver-me...

Rosa Alentejana Felisbela

domingo, 29 de setembro de 2019

Casamento


Hoje foi dia de caminhar pelo cais
Onde nos encontrámos em pensamento
Pelo ar subiam balões dos esponsais
O noivo e a noiva celebrando casamento

A noiva de branco e o branco brilhando
Numa luta de luz, entre agora e o tempo
Alguns saiam do grupo rindo e fotografando
E a vida fugindo, fugindo num sopro de vento

O noivo de azul, da cor do firmamento
Seus olhos sorrindo, sorrindo de enlevo
E todos querendo manter o momento
Juntando a felicidade ao quadro em relevo

Meus olhos intrusos saíram voando
Ao ritmo do sino da torre da igreja
Meu desejo estaria no adro dançando
A dança cigana num vestido da cor da cereja

No bico dos pombos um ramo ficou
Caiu nas águas e ficou flutuando
O passado, por um instante, voltou
Mas um salpico tocou-me passando

A sonoridade dos pássaros em melodia
Rasou-me os cabelos de forma harmoniosa
Asas de borboleta cresceram na nostalgia
E eu levantei voo e transformei-me em mariposa

Hoje apetece-me que o mundo saiba
Que beijo o teu anel, de mel a silhueta
Aguardando que no meu dedo caiba
Esse outro anel da cor da pena do poeta

As cordas das harpas as letras sublinham
Numa morte quase, quase iminente
Caem-me as asas, com o tempo definham
E sabem que o poema é de amor ausente

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
29/09/2019

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

Inocência


Para lá da utopia que trazem as promessas, deixamos a porta aberta para os sonhos. Eles que são feitos da magia que esquecemos, frequentemente, sobem como balões de tempo, rumo ao oásis da nossa inocência. Ela reside no mais recôndito espaço que mora na inconsciência. Ela brilha numa miríade de estilhaços caindo no olhar, como se uma chuva pirotécnica de feira se abrisse de par em par. E cada gota é capaz de despertar em nós a força acobardada nos medos, nas fragilidades. Perante o espetáculo do futuro, uma boca de espanto abre-se, deixando cair cada novelo de solidão, cada fiapo de tristeza, no chão da fantasia. Aí germinam lírios de alegria azul, rosmaninhos de regozijo rosa, alecrins de sorrisos verdes, e solta-se um perfume inebriante para os sentidos. A dança onde dormimos seguros desliza para a pista num passo arrojado em pontas de algodão. E giramos nos braços de mais uma ilusão, num novo porto seguro.

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
27/09/2019

quinta-feira, 19 de setembro de 2019

Sorriso doce de outono


Peço-te que me transbordes o outono nos olhos de troncos hirtos de castanho, nos lábios de romã vermelha, nas mãos de andorinhas grávidas de amor brando. Afaga-me os sonhos de nozes caídas em chão de folhas secas, e soletra-me o amor ao ouvido. Mostra-me as palavras frescas que a brisa vem sussurrar na pele arrepiada das águas. Traz-me o agasalho do manto alaranjado que tem o céu do sol por trás dos montes. Inspira-me o perfume que as rimas abrasam nas minhas veias. Desconheço a encruzilhada onde a fogueira arde. Não procuro as bermas que se ajustam ao corpo sem teto. Abro os braços à chuva e sigo as pegadas do teu sorriso. Ainda hei de sentir a impressão digital que me ficou na boca descomposta, entre os cabelos libertos de futuros, na marca vermelha entre os seios encrespados de “ais”, sobre o ventre de terra fértil de alegrias…Ouço os teus passos na areia silenciosa e o coração dispara murmúrios de fantasias, e a tua doce gargalhada. Só assim me sinto feliz!

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
19/09/2019
(IMAGEM DA NET)

quarta-feira, 18 de setembro de 2019

violino


Uma história sob o sol do violino clama a ausência. Um poema escrito c’o a pena da paixão exala o seu perfume através do chão puído e baço. Uma vela acesa brilha a um canto da sala e ilumina o esboço de uma dança sob os dedos manchados de grafite. A poeira ecoa no quarto escurecido pela noite pesada, enquanto uma colcha antiga sugere o compasso da música que os corpos ousaram amarrotar. O papel amarelou na parede desgastada, mas o amor, esse é sempre o mesmo! Este é o altar da vida. Não há tempo para o tempo passado, mas a memória acolhe a bem-aventurança do toque que ficou no violino! Um beijo flutua no eco que o abraço selou na música de sempre…Abro os olhos e sei que vai correr tudo bem.

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
18/09/2019
Still Life With Violin Andrey Morozov

segunda-feira, 16 de setembro de 2019

Multicolores


Multiplicam-se os véus entre os caules, suaves em ondas, como se de espuma se tratasse. São as obreiras de corpos macios e com muitas patas que os fabricam. Ligam verdes a lilases, sementes a troncos. E os dedos, mínimos, pousados, seguram-se a fios impossíveis, tão leves como as plumas que vestem os corpos de bicos direitos e olhares espertos e atentos. Ao mais pequeno ruído, o voo é certo. Ao mais silencioso movimento apanham o verme lento, que caminha imprudente, rumo a alguma folha pretendida. Perante um chilreio ou outro, a vida continua no seu ritmo de fantasia, enquanto a realidade nos dita as horas e diz de dedo em riste: Amanhã há escola!
Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
16/09/2019
(foto de Maria Manuel Neves)

domingo, 15 de setembro de 2019

De Roma


De Roma te escrevo letras ciganas. Rodo a saia colorida ao ritmo da nossa balada. Mostro o decote generoso, do meu peito apaixonado. Mas as minhas palavras gentias, não cabem no teu mundo de romance proibido. Pousas num verso, alcanças uma rima, mas voas cada vez mais alto, mais longe, mais distante. O barco onde navego naufraga-me na dor, mas nunca no tamanho. Se a minha silhueta não cabe nas tuas retinas, não insisto, nem me diminuo. Penteio os cabelos com o silêncio negro e envio-te o abraço da cinza que transforma o horizonte onde o sol se deitou em chamas. Do cimo dos meus pés descalços vejo o mundo coberto de pétalas de rosa. Sentes o perfume?

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
(imagem da net)

terça-feira, 10 de setembro de 2019

apaga


Apaga-me os planos, apaga-me o rosto, apaga-me o sorriso. Mas não deixarei de existir na tua vida. Saberás que estive nos teus braços, naquele ponto íntimo que tem a estrada antes do anoitecer. Saberás que me apoiei no teu ombro na curva mais larga, quando as rodas do carro tremiam de antecipação. Saberás que horas eram no relógio pejado de vida e a palavra soprada pelo ponteiro do relógio de sol. Saberás que o meu perfume te suspirou ternuras ao ouvido, e que as nossas mãos se tocaram na sombra curta do calor. Faz frio esta noite. E a lua caminha em forma de cigana pela minha rua. A cinza da fogueira ficou adormecida…ronronando brasas que podem ser de despedida.

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
10/09/2019
andrea torres balaguer photography

domingo, 8 de setembro de 2019

Chuvisco


Há um chuvisco guardado na nuvem pesada de céu. O vento cativa o cheiro a terra molhada. Uma poeira arenosa vasculha os cantos dos olhos e ficam a relampejar raios de sangue por dentro do branco quebrado do globo ocular. Sinto o vidro rachado do brilho arranhando com unhas de tristeza. Por fora há uma torrente que me escapa, conhecendo a tua ausência por dentro. Esse sal que ecoa no silêncio das palavras que conhecemos amarfanha-me a alma vazia de tão cheia! Suplico-te a pureza da razão, o segredo da verdade sublime…Do céu tombam, finalmente, flores da cor do arco-íris, colorindo os abraços dos amantes. O poema é um gesto diluído nas linhas de uma nova página.

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)

sábado, 17 de agosto de 2019

Poeira


Sopra, Amor, esse
teu sopro
sobre o meu corpo
de areia

teu hálito
de maresia
da tua boca
de maré cheia

pode ser
que essa aragem
me transforme
em grãos de poeira

e eu
não seja mais
do que passagem
de pegadas de sereia

ou que minha pele
se esfume
na espuma
que o mar branqueia…


Rosa Alentejana (Felisbela Baião)

sábado, 20 de julho de 2019

Silêncio


Calaram-se
todos os silêncios

balbuciam as folhas
segredos amargos

o vento rumoreja
mistérios intensos

e o cheiro da erva
sugere afagos

sigo as abelhas
no beijo consolador

inspiro a paz
por trás do valado

pressinto o sabor
do bago de sol

colhido entre o
sombrear calado

coloco o indicador
sobre os lábios

shhhhhhhhh
03/07/2019 16h55’
Quinta de Lourosa
Rosa Alentejana (Felisbela Baião)

segunda-feira, 13 de maio de 2019

Tantas vezes…


Deste lado
não há amarras
nem cordame

somente barro
lavrado
cigarras e enxames

deste lado
não há marés
ou maresia

apenas o luar
derramado
aos nossos pés

e a eterna
calmaria

mas as nuvens
escuras
trazem o temporal

e o vento
convida à vida
ao vendaval

da poesia
da loucura
do amor

e tantas vezes
da alegria…

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)

quarta-feira, 8 de maio de 2019

Liberdade de sonhar


"Se atravessar a aldeia montado no meu cavalo, chegarei mais depressa, mas se for a pé, verei mais coisas e os meus amigos convidar-me-ão para entrar em suas casas ..."
(in Papalagui)
Deixei a Casa do Professor para trás, no meio do branco das moradias lembrando os Mouros. As nuvens cinzentas abraçavam o sol, num namoro tímido e espaçado. A estrada havia rasgado os campos e seguia negra por baixo das rodas da minha viatura. Pensei na liberdade, de cabelos ao vento cheia de aromas primaveris e de sorriso no rosto. É bom poder usufruir da Natureza, do ar mais puro…A berma da estrada, enfeitada de magarças e papoilas, captava o meu olhar livre como o vento. Embrenhada em pensamentos capazes de fazer transbordar positividade do coração cheio de alegria, senti o alvoroço das asas de uma cegonha e imaginei-me a voar. A vontade de peito em quilha, a decisão de bico longo, e todo o azul do céu entrando pelos olhos, cruzando as asas brancas num mimoso planar… O pouso sobre a rocha num riacho ruidoso, ou por cima de uma amendoeira em flor, ou sobre as terras barrentas, o poder de resolução agarrado às penas e a esperança nos caules das plantas… Diminuí a velocidade e reparei que estava a chegar a casa. Só então me apercebi que vinha a poluir o ambiente no meu automóvel e que isso não era justo, embora o livre-arbítrio me permitisse deslocar da maneira que quisesse. Mas não podia ter ido a Aljustrel a pé, separam-nos alguns quilómetros… Ocorreu-me que tenho que fazer mais caminhadas ao ar livre. Livre como eu!

Felisbela Baião

domingo, 5 de maio de 2019

Lua


A lua derramava o seu tom prata sobre as ruas carregadas de sombras sinistras. Descalça, sentia as vibrações da terra, a liquidez das ervas e a vontade cortante de algumas rochas afiadas. Raras eram as coisas que lhe causavam tamanho prazer. A não ser o perfume da chuva na terra, ou o vento a acariciar-lhe o rosto. Sorria às estrelas que trazia bordadas no manto negro que lhe cobria a cabeça e todo o corpo, e cuja bainha começava a arrastar por causa do peso da lama que se agarrava ao tecido de lã. A noite continuava a abraçá-la de uma forma única e inalcançável para outro ser humano. Desde criança que tinha este ritual: em noites de lua cheia saía de casa sozinha, vestida da maneira descrita e dirigia-se para a barragem. Chegada ao local que poucos se atreveriam a procurar, por estar coberto de rochas e árvores e limos e de uma aura mágica, onde a bruma fazia a sua morada, ela desabotoava o manto com as suas mãos níveas e deixava-o cair no chão. O seu corpo bebia a cor da lua, os olhos cintilavam como pirilampos. Os seios firmes, como botões de rosa a desabrochar, o ventre liso como água escorrendo de um rio, o triângulo enfeitado com a penugem de um pássaro em início de vida, as pernas longas e sedosas, os pés perfeitos a caminhar rumo ao fundo daquelas águas tranquilas. Enquanto o líquido engolia aquele corpo jovem, os grilos cantavam na margem, as rãs coaxavam nas rochas próximas, e um silêncio assomava aos seus ouvidos, num deleite compensador. Ali se mantinha durante uma hora, a flutuar ou apenas sossegada, a sentir a força da água, a adrenalina da escuridão, o equilíbrio do natureza que tanto amava. Por fim, saía lentamente da água, enroscava-se no manto e voltava para casa, fazendo o mesmo percurso. Regressava revigorada, feliz. Chamavam-lhe “estranha”, “bruxa”, não gostavam da sua presença. Tudo o que é distinto causa algum desconforto e desconfiança. Todavia, ela era apenas uma mulher diferente…
Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
05/05/2019
(imagem da net)

terça-feira, 30 de abril de 2019

Acerca…


A cerca que me cerca
e aperta o destino

comprime o espírito
desalinha a luz

quando o sol
está a pino

e a sombra emborca
o corpo e o tronco

amarrado na cruz
e não há cheiro

não há terra nem árvore
ou erva que não seja

caduca porque machuca
a ferida que corre

nas águas tormentosas

meu remanso meu abrigo
meu fardo pesado

de lágrimas de fado
que morre

numa papoila solitária
que desconhece

o perfume da rosa

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
30/04/2019

quinta-feira, 25 de abril de 2019

Liberdade


Um dia, num horizonte longínquo, dissecaram um cravo, e através dele, inventaram um novo dicionário para a palavra jardim. A partir daí, o horizonte ficou perfumado, possibilitando o nascimento de outras palavras em outros jardins. Sabes porquê? Porque a liberdade é um suspiro de quem bebe horizontes por trás da sombra, e não se deixa morrer pela cegueira do medo.
Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
25/04/2019
(imagem da net)

sábado, 20 de abril de 2019


No canto encontro a fé
cruzando a sombra
no muro onde a luz
mora
e fora o suspiro
da saudade...
Rosa Alentejana (Felisbela Baião)

sábado, 13 de abril de 2019

Amor para toda a vida


Não se aconselha a leitura deste texto a pessoas sensíveis, pois é baseado numa história verídica, mas de contornos ainda mais macabros...

A Lua ia alta e o cemitério encontrava-se imbuído de uma atmosfera mística. O nevoeiro derramava os seus fiapos sobre as lajes estáticas e silenciosas. As fotos nas campas pareciam sorrir aos seus passos, coniventes com a escuridão da sua decisão. Passava da meia-noite e somente o cheiro da terra revolvida e das flores já murchas pairavam no ar. Um arrepio chegou-lhe à nuca, causado pelo vento frio que lhe roçava a gola da camisa negra. A sua respiração ofegante pela ânsia da procura expelia uma espécie de fumo branco, único traço que o denunciava no meio de tanto negrume. Trazia nos olhos um mar de mágoas e nas mãos o vazio da ausência, bem como uma pá. Quando se aproximou do local, cravou as botas na terra ainda fresca e escavou. Escavou até encontrar a caixa que guardava o bem mais precioso da sua vida: a sua própria vida! Ela fora a sua companheira, a sua amante, a sua cúmplice, a sua amiga, a sua tudo! Quisera o destino que o tesouro do seu coração não fosse forte e tivesse sucumbido de repente, sem nada o fazer prever. Porém, esse amor da infância, que se prolongara por tantos anos de casados, não vivera o suficiente de tanta felicidade. Recordava-se como se de hoje se tratasse: os dois sob a sombra da laranjeira, de mãos unidas e olhos entrelaçados, prometeram cuidar um do outro mesmo depois da morte. Prometeram, com a anuência das águas da ribeira que, aquele que vivesse enterraria o outro por baixo daquela árvore da casa onde iriam viver. Dessa forma, poderiam, para sempre, cheirar o perfume da flor que os apaixonava, e onde tinham brincado e feito amor pela primeira vez. Por essa razão, ele tinha ido recuperar o corpo da sua amada. Quando conseguiu abrir a caixa, retirou com a delicadeza do seu amor aquele corpo silente, frio…O mar que trazia nos olhos transbordou pela alma, molhou o vestido e a camisa numa mistura inconsolável. O abraço quase tocava a eternidade. Levantou-a e foi arrastando a dor pelo chão, com a culpa na garganta, mordendo as palavras até gastar a incerteza do que fazia. Do cemitério até sua casa demorou apenas alguns minutos. Felizmente não havia ninguém nas redondezas, ou chamar-lhe-iam louco, profanador de cemitérios. Mas ele tinha um propósito digno, sério e verdadeiro: cumprir a sua promessa. Não lhe tinham dado ouvidos, ele quisera enterra-la no quintal da sua casa, mas por motivos sanitários impediram-no. Agora estava a repor a sua palavra. Chegado a casa, com todo o cuidado, levou-a para a casa de banho e tirou-lhe aquele vestido, lavou-lhe o corpo com água tépida, pedaço a pedaço, com toda a doçura que encontrara dentro da sua convicção. Enxugou-a com leves toques do seu toalhão preferido. De seguida, hidratou-lhe a pele com os óleos aromáticos que ela sempre usara. Perfumou-lhe os cabelos com o seu champô preferido, penteando-a como ela gostava. Depois vestiu-a com as roupas que lhe oferecera no aniversário. Colocou-lhe o batom que adorava e deu-lhe o último beijo apaixonado, chorando copiosamente, afirmando-lhe que a amaria para toda a vida. Envolveu-lhe o corpo no tecido de veludo carmim da colcha que ela comprara para a cama e foi deposita-lo na cova aberta antecipadamente. Rezando, atirou algumas pás de terra sobre ela. Por fim, entrou em casa, colocou a música das suas vidas a tocar e voltou a sair, indo sentar-se sob a laranjeira, perto da campa recordando-lhe alguns momentos de felicidade que viveram juntos. Era assim que pretendia continuar a viver…Aguardava que o dia chegasse. Quem sabe o que o sol traria na amanhã seguinte…A sua promessa estava cumprida. O seu desespero terminara.
Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
13/04/2019
(imagem da net)

quinta-feira, 11 de abril de 2019

Que a onda venha


Que a onda venha
Que o mar te traga
Que eu fico sem pena
Na areia sagrada
Que a onda venha
Que o mar te traga
Que eu aguardo a espuma
Envolta na vaga
Que a onda venha
Que o mar te traga
Que a saudade envenena
E a ausência me enfada
Que a onda venha
Que o mar te traga
Que eu sinto inveja
Do sabor do sal
Que a tua pele alveja
No escuro abissal
Que a onda venha
Que o mar te traga…
Rosa Alentejana (Felisbela Baião)

As rosas que plantaste


As rosas que plantaste no quintal continuam a sua saga de cor e perfume, em arroubos de primavera ventosa e fria. Recordo-te sentado na cadeira que balançava com os teus pensamentos mais tenebrosos. Aquela cadeira onde descansavam os teus ombros fatigados, vestidos com o casaco de lã da cor da esperança que te fugia, por entre os dedos do tempo. E as tuas mãos, cada vez mais tristes, repousavam no teu colo de carinho e tanto amor. De boina sombreando os olhos, protegendo os parcos cabelos brancos, olhavas as rosas alaranjadas. Por certo pensavas na aventura de trazeres uma “poda” de França, dentro da mala de cartão que guardavas sobre o roupeiro, ganhando o pó das lembranças árduas. Tinhas um mar nos olhos, e as palavras trancadas na garganta. O cão aproximava-se e lambia-te as mãos pedindo atenção e tu fazias-lhe a vontade. Tu não querias partir. Não querias embarcar na viagem. Não querias deixar os que amavas. E comias o silêncio, mordias palavras e aceitavas abraços que ficaram na memória para sempre. Escutavas o som dos pássaros a cantarem as “modas” que amavas e cortavas o horizonte em pequenos bocados para levares guardados nos bolsos. E as rosas que plantaste, continuam a crescer no quintal, rumo ao céu onde te irão, certamente, encontrar.

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
10/04/2019

segunda-feira, 1 de abril de 2019

Gotas


Caíam lentas a gotas que lavavam as ruas. Que abençoavam o pó transformado em barro. Que desaguavam nos regatos. Que iam ao encontro dos barrancos, formando pequenas poças. Também os meus olhos corriam como sombras, com a deslocação da água, através das vidraças da janela. Paravam na esquina da parede vestida de cal e de azul da casa da frente. Era a moradia do Carlos Aventureiro. Dizia-se que o Carlos tivera várias mulheres. Umas solteiras, meninas prendadas e de famílias ricas. Outras casadas, mas sonhadoras, que viram no Carlos uma forma de fugirem de casamentos insatisfeitos. Outras viúvas e carentes. O que unia estas mulheres era tão-somente a solidão. Aquela sensação de falta que rasga por dentro, que dilacera as entranhas em mil bocadinhos transformados em lágrimas que nunca secam. Aquela solidão que olha para as gavetas vazias. Que vê a ausência sentada na beira da cama. Que ensurdece os sons da fala. Que carrega a cegueira às costas como brinde- surpresa para o coração. Mas o Carlos era parecido com o pássaro exuberante, que não tinha ninho certo. Exibia a plumagem, emitia o chamamento mais ousado, a dança mais apelativa, mas nunca ficava. Ao passar um ou dois meses de namoro, batia asas e voava para outras paragens. Ficavam as damas a transbordar tristezas, e os familiares a jurar vingança. Quis o destino que se estabelecesse na minha terra, justamente na casa da frente. Nas suas idas e vindas enamorou-se da minha avó Clotilde, senhora da mesma idade, viúva há muitos anos. Todos os dias ele lhe deixava um raminho de camélias no parapeito da janela, mas a avó deitava-o para a rua, cheia de indignação por ele não respeitar a sua condição e as vestes negras que carregava. Uma vez, cruzou-se comigo na rua, retirou o chapéu respeitosamente, e deu-me o raminho para lhe entregar diretamente, juntamente com um rebuçado para me comprar a cumplicidade. Sorri, agradeci e entrei aos saltos em casa fazendo o que me pedira. A avó Clotilde zangou-se comigo e voltou a atirar o raminho pela janela. Fugiu o sorriso ao rosto do Carlos. Andava agora tristonho, passava na rua ensimesmado, carregando o peso das recusas da minha avó. Quis o destino que a minha avó partisse por culpa do coração destroçado pela ausência do meu avô. Foi quando o Carlos passou a colocar os seus raminhos de camélias sobre a campa da avó Clotilde. E eu fico sempre à espera que ele regresse a casa, com receio que algo lhe aconteça. Por fim, vi que acabou de entrar em casa, de casaco escuro escorrendo tristeza das mangas. O chapéu-de-chuva tombara à entrada da porta, deixando que as gotas se alojassem nos cabelos brancos do Carlos. A vida tinha sido uma procura de ninhos, e o ninho que ele aprendera a amar nunca o alimentou. O meu olhar cuida do Carlos, enquanto o meu coração transborda de compaixão pelo amor que ele nutre pela avó Clotilde…

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
01/04/2019
(imagem da net)

domingo, 24 de março de 2019

Desfeito na espuma


És mar manso
inteiro e bravio

doce remanso
em proa suspensa

sorriso de arco
íris de esperança

que traga o rio
da minha lembrança

corpo quente
de onda

vendaval de espuma
de ternura branda

a gota que abre
meu ventre de bruma

a chuva copiosa
que por vezes
me afunda

me ergue sereia
e em palavras
me abraça

és mar de poesia
e eu sou tua

sonho que flutua
em completa rosa…

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
24/03/2019

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Aeroporto


Antes da lembrança
apenas havia
a linha dos carris

hoje pondera-se a segurança
e o gasto de energia
-faltam pingos nos is-

Preocupa-nos o impacto
no ambiente?
E o absurdo fator poluente?

E vai mudando de lugar
o conflito, o interesse
- a estudar no presente-

Reclamam as aves?
Desenvolve-se o comércio
e o ruído

A razão está de
que lado?
Do silêncio, do político…

Onde está o dever?
No efeito colateral
ou no medo?

Quem vai proteger
de acidentes
o ar, o solo de Portugal?

Em nome do meio
envolvente
qual o benefício, afinal?

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
(imagem de pesquisa google)

domingo, 17 de fevereiro de 2019

Da falta que sinto


Tenho frio:
sopro para as mãos
em concha,

mas a náusea,
o vazio
escavam-me a pele

em caminhos vãos
de terra húmida
de húmus humano

e de silêncio quebrado
pelo canto gritado
do pássaro negro

sobre o cedro
e o pranto…ai o pranto
é espinho cravado na garganta

e as lágrimas
(tantas!)
toldam-me a visão

e a razão
esvai-se
num segundo

voltando depois
do bombear arrítmico
do coração

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)

terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Respira a terra


Entre as folhas
da clareira
o sonho aberto

o ribeiro desperto
chilreia ao longe
- o som -

o cheiro molhado
pintado
de sombras bordadas

nem uma brisa ecoa,
só a folha do abeto lento
movendo…

ar eterno
e secreto
por dentro de mim

na paz do ninho
o bico aflora
a pena

medita o galho
e o gaio voa
em flocos de céu

zumbidos de abelhas
num labor
num amor

que adoça
o frescor da sílaba
- sim -

debaixo da rocha
tenra
a terna terra

a raiz da relva
a seiva, a selva
feliz

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
05/02/2019

domingo, 3 de fevereiro de 2019

O melhor companheiro


Lembras-te? Ele cruzava a rua a correr desesperado, como se não houvesse um amanhã para concretizar o que tinha em mente. Não se importava com o frio cortante, ou com o calor estonteante. Tinha um fito. E nada o poderia demover. De nada adiantava gritar-lhe e pedir que tivesse cuidado com os carros. Eles haviam de parar quando o vissem. Mas o que mais te confrangia era esse desejo que ele tinha por cheirar a parte traseira das visitas. Por mais que lhe pedisses para não fazer isso, instintivamente, ele tinha que saber informações sobre as pessoas, tal como fazia com os seus amigos. Saltava-lhes para o colo, e havia quem detestasse. E tu, da forma mais gentil que conhecias, pedias para estenderem a mão no sentido de que ele pudesse cheirar e deixá-los em paz. Uma vez, quando uns familiares vieram visitar-nos, ele fez xixi na perna das calças da tua irmã, o que te deixou envergonhado (eu ri-me imenso). Porém, era a sua maneira de expressar o nervosismo de ver tanta gente em casa, habituado a ver apenas três pessoas diariamente. O carinho que ele demonstrava ao ver-nos chegar a casa era algo que te deixava encantado, recordas-te? Os saltos, rodopios, corridas em círculo à volta da casa, uivos e derrapagens, deixavam-me tonta, mas divertida. O pior de tudo era quando tu atendias o telefone. Primeiro sentava-se a olhar para ti. Depois latia bem alto. A seguir ia buscar o comando do televisor ou outro objeto que te fazia falta e roía-o…Ficavas irritado e tinhas que pedir desculpa e desligar o telefone. À hora das refeições sentava-se a olhar-nos com olhos de quem não comia há semanas. Depois levantava as patas e batia com elas nas nossas pernas, para que lhe déssemos atenção e caísse alguma coisa na sua boquinha gulosa. E naquela vez em que eu chorei e ele veio para o meu colo, muito atento, a ganir e a lamber-me as lágrimas? Abracei-o e ele não me deixou sem que eu parasse de chorar. E sempre que tinhas uma ferida? Ele ia sempre tentar lamber o local, como se o quisesse curar…Na rua era diferente. Lembro-me quando tu ias passear com ele. Em pequeno, eras tu a “passeá-lo”, puxavas pela trela dele porque queria cheirar tudo e deixar a sua marca em todos os contentores de lixo. Depois que ele cresceu, era ele a “passear-te”, mal aguentavas segurá-lo por causa do porte pesado e cheio de vigor. E são assim os nossos animais: mimados, mas os melhores companheiros. Alguns são tratados como se fossem da família que os acolhe. Outros são tratados de forma desumana…

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
(imagem da net)

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Não desistas...


Levanta os olhos para o voo das retinas. Repara que são meigas bailarinas levantando o vestido, a preceito, mostrando os sapatos e a vida, o conceito, correndo mesmo ali ao lado! Segue o retorno com afinco e rodeia o ombro amigo com calor. Sente o contorno do corpo, emanando o amor. Releva a cor que parecem ter os montes, procura sentir o perfume das flores e o sabor da água pura das fontes! Bebe a pureza do respeito e coloca a sobriedade a teu jeito. Depois abre as asas e sonha, não desistas! Deixa que o teu poder se sobreponha, porque a vida é curta e o amanhã está para vir.

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)

segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Bendigo


Sabe-me a pouco
e a tanto
- o tempo -
passado contigo

um sorriso
um olhar ternurento
- um castigo? -

e a alegria
mansa
do compromisso

retine por dentro
a voz
ao ouvido

enche-se a retina
de paz
- o abrigo -

e o ombro
tão forte
- amigo -

recorda-me
a infância
- o viço -

a tua mão
sobre o coração
- meu feitiço…

o carinho vagaroso
partilhado
que bendigo!

Rosa Alentejana Felisbela
28/01/2019
Imagem - OIL PAINTING, GIFT, PALETTE KNIFE by Monika Luniak

terça-feira, 1 de janeiro de 2019

Quando a luz...


Quando a luz
do teu destino
esmoreceu

e se fez névoa
e desalinho
sobre as águas

toda a barragem
entristecida
se escondeu

na neblina
na cor da terra
e se fez prata

bem sei
que o coração
se enredou

na dor noturna
que me esmaga
e me corrói

mas por dentro
outra luz
me iluminou

e sei que o tempo
não me mata
nem me destrói

Eu vejo a estrela
a vela acesa
a tua aurora

que a semente
do que sou
é o que chora

e que por dentro
o que ensinaste
germinou

e sou a força
que te amparou
e vive agora!

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)
01/01/2019