sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Tarde


Era uma tarde alaranjada como qualquer tarde entardecida pelo outono. Corria uma brisa fria pelas ruas empedradas, escorregadias da humidade. E os tacões altos batiam ao ritmo apressado, afastando-se da multidão.
Sobre os sapatos azuis novos, caminhavam uns pés cansados, envoltos numas meias pretas que subiam pelas pernas torneadas, perdendo-se de vista quando os olhos chegavam à bainha do vestido de algodão bege.
O busto volumoso, cingido pelo tecido justo, oscilava seguro ao compasso dos passos. Um casaco grosso aos losangos bege e vermelho abraçava-lhe a silhueta. A cintura afunilava num espanto feito de idade verde.
Os cabelos loiros e longos, envoltos no véu diáfano do nevoeiro, completavam o quadro e as sombras emolduravam as formas da mulher.
Ao passar perto dele, inocente e ausente em pensamentos desconhecidos, de rosto coberto pelos cabelos, quis o destino que deixasse tombar um lenço sobre a calçada.
Ele, figura esguia encoberta pelas sombras do toldo da esplanada do café, acorreu solícito para lho devolver.
Ela parou surpreendida e olhou para a mão que segurava o lenço e agradeceu. Uma mão segurava a mala presa ao ombro direito, a outra, que estava livre, exibia uma aliança brilhante.
Agradeceu e seguiu caminho.
Nunca lhe viu o rosto, mas sentiu o peso do cadeado na sua motivação.
Seguiu em sentido contrário pela estrada empedrada, sujeito aos tropeções devido à humidade daquela tarde de outono.

Rosa Alentejana Felisbela
16/11/2018
(imagem da net)

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