quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Diário de um tipo inconveniente


Os cães não param de ladrar no quintal do vizinho. A minha cabeça começa no mesmo rodopio de sempre. As dores nos músculos, no braço, no peito. E a amargura que não consigo engolir de uma só vez. Se eu conseguisse, abria a boca e mordia cada bocado das minhas insatisfações, cada migalha das preocupações, cada grão de pó dos pensamentos retorcidos e comia-os. Podia assim, engravidar de defesas e parir novos sonhos. Quem mos tirou? Quem mos levou? Onde ficaram? Sei que preciso mudar, mas falta-me aquele clik no botão da sabedoria. Os cães continuam na sua azáfama, e as minhas reflexões continuam disparatadas. Um sopro de vento quente inunda a pouca vontade que há em mim. Levanto-me da cadeira e recebo-o pela janela aberta. Mais um dia para recomeçar.

Rosa Alentejana (Felisbela Baião)

2 comentários:

  1. Mais uma passagem pelas insónias constantes que nos evolvem a alma... essa inquietude que nem a alma nos descansa... nem o corpo se consola...

    ResponderEliminar