segunda-feira, 18 de maio de 2015

Das searas


Eu nasci do gérmen do trigo, tenho a pele trigueira de quem trabalha à sombra do sol, esse que morde e fustiga a seara inteira e enfeitiça a corola do girassol.

Tenho nos lábios a cor vermelha da papoila no meio da seara encerrada, enquanto na terra mato o fastio e no estio floresço só e abandonada.

Carrego o perfume da flor-da-laranjeira nos cabelos longos, negros e ondulados, como searas sopradas pelo vento, em dias tempestuosos de céu escuro e amargurado.

Seguro nas mãos o cheiro da terra quando fica molhada, e da flor-da-amendoeira o branco imaculado, cúmplice com a luz quando o sol fica a pino na seara por trás do silvado.

Sustento nos olhos o verde das folhas miúdas das oliveiras, quando enamoradas pelo castanho do barro guardado perto da eira, e numa dança serena, que a seara ondeia, se envolvem num jogo de cores amenas.

Bebo com avidez o som das cigarras recortando o verão, enquanto atento no restolhar das searas, descobrindo os ninhos de palavras pequenas de onde eclodem poemas, simples mistérios com letras claras.

Sob o olhar cuidadoso das estrelas abraço a seara, e em pontas dos pés estico-me e dou um beijo na lua, mas invento o seu hálito enamorado, porque este Alentejo percorre-me as veias, mas é de mel moreno o tema que escolho para escrever o meu fado.

Rosa Alentejana
18/05/2015

Sem comentários:

Enviar um comentário